sábado, 19 de agosto de 2023

Leve a sério - Êxodo 4:24-26

 E aconteceu no caminho, numa estalagem, que o Senhor o encontrou, e o quis matar.

Então Zípora tomou uma pedra aguda, e circuncidou o prepúcio de seu filho, e lançou-o a seus pés, e disse: Certamente me és um esposo sanguinário.

E desviou-se dele. Então ela disse: Esposo sanguinário, por causa da circuncisão.

Êxodo 4:24-26

Moisés havia acabado de receber uma missão do Senhor: retornar ao Egito como libertador do povo hebreu que estava vivendo em escravidão. Ele deveria fazer diante do Faraó todas as maravilhas do Senhor estava fazendo, e dizer ao povo que Deus havia atentado para sua aflição.

E nos deparamos com um dos relatos mais emblemáticos acerca das ações de Deus: O Senhor que acabara de ordenar à Moisés que retornasse ao Egito, no caminho, deseja matá-lo. É aparentemente incoerente que Deus tenha dado ao líder israelita uma missão, e em seguida tenha o sentenciado a morte sem dar a oportunidade dele exercer o seu chamado. Entretanto, não estamos diante de qualquer contradição ou incoerência da parte do Senhor, e sim da parte do próprio Moisés, conforme abordaremos nos tópicos a seguir.

1º Moisés não estava levando Deus a sério

Precisamos compreender que Moisés ainda não tinha noção do peso das suas palavras e decisões. Ele já havia irado ao Senhor por ter se recusado a ser o porta-voz de Deus ao povo, conforme os versículos 14 e 15. É compreensível que Deus demonstrasse Sua ira e poder ao patriarca, a fim de que este acordasse à realidade de que não poderia se opor e questionar ao Senhor constantemente.

Deus em Sua misericórdia já havia usado de benevolência com Moisés diante da sua recusa de ser porta-voz, e diante das suas constantes reclamações acerca de não ser capaz de convencer o povo. Deus manda Moisés, e ele reclama que o povo não iria crer nele e dar atenção. Então Deus concede à ele um bordão através do qual poderia operar milagres. 

Em seguida Moisés reclama de não ser eloquente, e Deus age de misericórdia e assegura à Moisés que ele mesmo ensinaria o que deveria ser dito! Ante a incapacidade de Moisés, o próprio Deus o ensinaria, com a mesma proximidade e relação que Adão teria nas visitações no Éden caso não tivesse caído.

Mesmo assim Moisés reclama novamente, a ponto do Senhor se irar contra ele.

Moisés não havia compreendido que estava falando com o Deus Todo Poderoso, e que era pequeno, e mesmo que Deus se dispusesse a falar diretamente com ele, isso não fazia que ele fosse mais do que poeira na eternidade. Moisés por diversas vezes questiona a escolha e sabedoria de Deus, olhando não para Deus, e sim para si mesmo e suas limitações.

E a gota d'água acaba sendo a incircuncisão de Gérson, o seu filho. A circuncisão era o sinal da aliança de Deus com Israel, e também uma Lei de Deus dada à Abraão, associada às promessas. Ao não circuncidar seu filho, Moisés estava novamente descumprindo uma ordem de Deus. Ele precisava ser confrontado com a sua desobediência e rebeldia. Como homem, era normal ter dúvidas, e Deus compreende isso. Só que as dúvidas não podem ser justificativas para desobediência à ordens expressas dadas por Deus.

E o que isso nos ensina? Não podemos viver com Deus pela metade, apenas naquilo que é vantajoso.

2º Moisés não estava levando seu chamado a sério

Deus separou Moisés para ser o libertador e líder do povo hebreu após o cativeiro egípcio. Ele seria, portanto, o porta-voz de Deus para os homens, aquele que seria responsável por ensinar a vontade de Deus ao povo recém liberto e que precisava ser conduzido.  Moisés havia sido chamado por Deus para erguer novamente a nação de Israel.

Moisés estava a caminho do Egito para se apresentar como libertador de um povo, e era evidente que ele não agia de acordo com seu chamado. Ele iria lembrar para o povo aflito sobre as promessas de Deus, e a aliança com Israel, e ele mesmo não vivia de acordo com a aliança. Ele mesmo não estava considerando a hipocrisia de não circuncidar o próprio filho. 

O patriarca não estava considerando a seriedade e comprometimento necessário para cumprir a ordem dada por Deus, e se dispôs a ser simplesmente um porta-voz, e não um verdadeiro israelita. Ele ensinaria sobre um comprometimento que ele não era capaz de ter. Ele falaria de uma aliança que ele mesmo não praticava em sua família. Ele não estava levando seu chamado a sério, e para ele se tratava simplesmente de ir levar uma mensagem, e não de comprometer a si mesmo e sua família em um compromisso definitivo com Deus. É possível que Moisés achasse que seu chamado seria temporário e breve, de forma que sequer se preocupava em se apresentar irrepreensível.

E o que isso nos ensina? O mensageiro não está acima da sua mensagem. É preciso ser coerente com aquilo que se prega e se vive.

3º Moisés não estava levando a sua família a sério

A aliança com o povo de Israel era uma aliança de sangue. Fazer parte da promessa de Deus consistia, em primeiro lugar, fazer parte do povo de Israel. Ao não circuncidar Gérson, ele estava privando seu filho das promessas de Deus para sua vida. Moisés estava deixando a sua família de fora da sua missão.

E nessa disposição de compreender que a missão de Moisés tinha impacto direto na vida da família, Zípora circuncida Gérson, dando cumprimento ao mandamento do Senhor para vida do menino. E não apenas isso! O ocorrido traz a própria Zípora para a família de Israel, e é por isso que ela chama Moisés de marido sanguinário.

Ela não estava criticando Moisés pelo derramamento de sangue, mas dizendo que se antes o parentesco deles se dava pela aliança com a família da esposa no momento em que foi acolhido, agora eles estavam unidos também pela aliança de Deus para aquela família. Daquele momento em diante a família de Moisés fazia parte da aliança do Senhor, e eram família, e família em Cristo.

E o que isso nos ensina? Não afaste sua família do Senhor, mesmo sob o argumento de estar fazendo a vontade dEle.

domingo, 13 de agosto de 2023

João 5:10-16

Então os judeus disseram àquele que tinha sido curado: É sábado, não te é lícito levar o leito.

Ele respondeu-lhes: Aquele que me curou, ele próprio disse: Toma o teu leito, e anda.

Perguntaram-lhe, pois: Quem é o homem que te disse: Toma o teu leito, e anda?

E o que fora curado não sabia quem era; porque Jesus se havia retirado, em razão de naquele lugar haver grande multidão.

Depois Jesus encontrou-o no templo, e disse-lhe: Eis que já estás são; não peques mais, para que não te suceda alguma coisa pior.

E aquele homem foi, e anunciou que Jesus era o que o curara.

E por esta causa os judeus perseguiram a Jesus, e procuravam matá-lo, porque fazia estas coisas no sábado.

João 5:10-16


CONTEXTO

  • Jesus cura o homem paralítico e manda ele recolher o seu leito e andar
  • Os judeus repreendem o homem por estar fazendo trabalho no sábado
  • Os judeus perseguem Jesus por operar milagres no sábado

1 - O PRÓPRIO SENHOR JESUS É O SENHOR DO SÁBADO

  • O sábado é o descanso
  • Jesus consagra o sábado para Si com Suas próprias obras e ações
  • Sábado como um ato de fé


2 - OS JUDEUS ESTAVAM TÃO PREOCUPADOS EM JULGAR QUE NÃO ESTAVAM DISPOSTOS A OUVIR
  • Os judeus repreendem o homem sem tentar entender seus motivos
  • Estavam tão preocupados em julgar que sequer pensaram eu ouvir o homem
  • Estavam tão preocupados em julgar que não eram capazes de se maravilhar com o milagre
  • Estavam dispostos a matar o próprio Jesus

3 - CRISTO É SOBERANO SOBRE A VIDA DE JUSTOS E INJUSTOS

  • Num primeiro momento Jesus cura a saúde do homem
  • Num segundo momento Jesus se dá a conhecer ao homem

APLICAÇÕES
  1. Precisamos aprender a descansar no Senhor e descansar com o Senhor
  2. Não podemos nos precipitar em julgamento sem sequer ouvir ao nosso irmão
  3. Não podemos medir o amor de Jesus por bênçãos passageiras oriundas da Graça
  4. A única demonstração válida da afinidade com Deus na vida de um homem é a santificação

João 5:1-8

 Depois disto havia uma festa entre os judeus, e Jesus subiu a Jerusalém.

Ora, em Jerusalém há, próximo à porta das ovelhas, um tanque, chamado em hebreu Betesda, o qual tem cinco alpendres.

Nestes jazia grande multidão de enfermos, cegos, mancos e ressicados, esperando o movimento da água. 

Porquanto um anjo descia em certo tempo ao tanque, e agitava a água; e o primeiro que ali descia, depois do movimento da água, sarava de qualquer enfermidade que tivesse.

E estava ali um homem que, havia trinta e oito anos, se achava enfermo.

E Jesus, vendo este deitado, e sabendo que estava neste estado havia muito tempo disse-lhe: Queres ficar são?

O enfermo respondeu-lhe: Senhor, não tenho homem algum que, quando a água é agitada, me ponha no tanque; mas, enquanto eu vou, desce outro antes de mim.

Jesus disse-lhe: Levanta-te, toma o teu leito, e anda.

Logo aquele homem ficou são; e tomou o seu leito, e andava. E aquele dia era sábado.

João 5:1-9


CONTEXTO

  • Jesus encontra um tanque onde conhecidamente milagres aconteciam
    • De tempos em tempos Deus enviava um anjo ao local
  • Havia um homem que aguardava 38 anos para ser curado da sua enfermidade
    • Não se tem informação da enfermidade, mas se depreende ser incapacitante
    • Todos os enfermos apontados eram humanamente incuráveis (cegos, mancos, ressicados)
    • Ninguém se compadecia de ajudar esse homem

1 - ESSE TEXTO MOSTRA A NATUREZA HUMANA NA SUA FORMA MAIS PURA

  • Todos ali são incapazes de ajudar o próximo estando necessitados também
  • O homem  não tinha mais esperanças
  • O homem acredita que os benefícios de Deus dependem em algum grau da sua capacidade
  • O homem sozinho não tem forças para nada:
    • Nem entrar no poço;
    • Muito menos conseguir a cura das suas enfermidades

2 - ESSE TEXTO NOS MOSTRA A OBRA DE JESUS

  • Diferente dos homens, Jesus é o único disposto a ajudar graciosamente;
  • É Cristo quem caminha em direção ao homem, que nada pode fazer;
  • É o poder de Jesus quem opera a cura
  • A obra de Jesus não pode ser planejada e condicionada
    • Jesus cura num sábado, onde os homens não aceitavam qualquer obra

3 - APLICAÇÕES

  1. Não podemos perder a esperança quando não vemos as coisas acontecerem
  2. Não podemos por um minuto sequer depositar a nossa fé em nós mesmos ou no outro
  3. Não podemos por um minuto sequer duvidar da graça e bondade do nosso Deus
    1. Ele de fato nos salvou para Si
    2. Ele é benevolente a todo tempo
    3. Não podemos comprar seu favor nem com cultos

sábado, 29 de julho de 2023

Jesus e a mulher samaritana - Parte 03 (João 4:27-38)

E nisto vieram os seus discípulos, e maravilharam-se de que estivesse falando com uma mulher; todavia nenhum lhe disse: Que perguntas? ou: Por que falas com ela?

Deixou, pois, a mulher o seu cântaro, e foi à cidade, e disse àqueles homens:

Vinde, vide um homem que me disse tudo quanto tenho feito. Porventura não é este o Cristo?

Saíram, pois, da cidade, e foram ter com ele.

E entretanto os seus discípulos lhe rogaram, dizendo: Rabi, come.

Ele, porém, lhes disse: Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis.

Então os discípulos diziam uns aos outros: Trouxe-lhe, porventura, alguém algo de comer?

Jesus disse-lhes: A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra.

Não dizeis vós que ainda há quatro meses até que venha a ceifa? Eis que eu vos digo: Levantai os vossos olhos, e vede as terras, que já estão brancas para a ceifa.

Lucas 4:27-38




Os discípulos que haviam saído para comprar comida retornaram do mercado e se surpreenderam de encontrar Jesus conversando com uma mulher. A razão pela qual os discípulos ficaram surpresos já foi apresentada nos sermões anteriores, podendo se considerar não apenas o fato de Jesus estar falando publicamente com uma mulher, mas também pelo fato de sendo ele um mestre judeu, estava conversando com uma samaritana. Entretanto, nenhum deles se dispõe à questionar o mestre sobre o que falava com ela ou qualquer coisa do tipo.

Precisamos compreender que os discípulos também eram judeus, sendo razoável compreender que suas relações com os samaritanos também não fossem além das relações comerciais e estritamente necessárias. Por outro lado, ver Cristo dialogando publicamente com uma mulher samaritana ia muito além do que poderia ser considerado normal.

Entretanto, naquele momento nenhum dos discípulos se arrisca a fazer qualquer questionamento, mesmo que as ações de Jesus levantassem curiosidade. Pode ser que naquele momento os discípulos tenham se dado conta que o Senhor sentar-se para conversar com uma mulher samaritana era tão inesperado quanto que ele escolhesse para seus discípulos um pescador e um cobrador de impostos. Tão inusitado quanto confiar o tesouro do evangelho para homens pobres e incultos, ao invés de trazer para seu lado fariseus e doutores da Lei.

Já de início temos a primeira lição: Muitas vezes ao caminhar com Cristo nos deparamos com questões e situações que não somos capazes de compreender. 

Nestas oportunidades, devemos agir da mesma forma que os discípulos, e com extrema humildade aguardar até que o Senhor decida nos revelar a Sua sabedoria e nos iluminar com o entendimento vindo do Espírito Santo. 

Há mesmo na própria Palavra passagens e trechos que num primeiro momento podemos ser incapazes de compreender, ou até mesmo ficar chocados com relatos como o de filhas que embebedaram seu pai para terem filhos, povos inteiros sendo dizimados, profetas sumonando ursas para atacar jovens ou coisas do tipo. 

Neste momento, a barbaridade dos relatos bíblicos, a extensão de fé que é esperada do cristão diante de situações complexas ou mesmo situações que nos expõem à risco de morte podem nos causar indignação. Entretanto, conforme pedimos orientação ao Espírito Santo e maturidade e humildade para nos submetermos à Palavra, percebemos que aquele primeiro choque decorre, na verdade, da nossa própria incapacidade de pensar à luz da Palavra e pela falta de experiência na vida cristã.

Ao mesmo tempo em que os discípulos estão retornando, a mulher sai imediatamente em direção à cidade da qual eles haviam acabado de chegar. A resposta da mulher à afirmação de Jesus de que Ele era o Messias foi a imediata fé, da qual não decorreu qualquer resposta ou pronunciamento apaixonado. A maior demonstração de uma fé genuína foi a vontade imediata de partilhar as boas novas que havia acabado de receber.

Eis a segunda lição: devemos ter o mesmo zelo evangelístico que a mulher samaritana. 

Importante ressaltar que a única coisa que aquela mulher ouviu da parte de Jesus é que Ele era o Messias. Jesus não havia ensinado nada como fizera no sermão da montanha, não explicou para aquela mulher o Pentateuco que ela possuía, não abordou as grandes profecias do Antigo Testamento acerca da Sua vinda. Ele havia apenas declarado para aquela mulher quem Ele era, e para ela, que havia acabado de testemunhar o Seu poder, foi o suficiente.

Aquela mulher então parte em direção à cidade, e convida aos demais a testemunhar da presença santa de Jesus Cristo. Ela não se presta a tentar convencer qualquer homem acerca de quem Cristo era, e os convida para desfrutar da presença do Mestre e desenvolver um relacionamento pessoal com Ele, dando o testemunho de tudo que Jesus havia revelado sobre a vida dela, demonstrando Seu próprio poder. 

Aquela mulher não tinha qualquer instrução para dar, e para piorar, era detentora de um passado sórdido, e provavelmente conhecido por toda a cidade. Não era só mulher, o que por si só já descredenciaria a sua palavra; mas também era adúltera, o que fazia dela uma pessoa socialmente reprovável, e até mesmo passível de apedrejamento.

As nossas limitações podem nos impedir de entrar em debates teológicos e nos fazer perceber que somos incapazes de convencer alguém acerca da existência de Deus e da divindade de Jesus Cristo. E de fato, nós somos incapazes. As pessoas podem zombar de nós por nosso passado e história, e até mesmo tripudiar tudo aquilo que nós falamos simplesmente por ter sido dito por nós mesmos. Da mesma forma que a mulher samaritana poderia ser desconsiderada por ser uma mulher adúltera, podemos ser desconsiderados por sermos ex-traficantes, ex-adúlteros, devassos, maliciosos ou criminosos. Nem por isso podemos nos acovardar e deixar de pregar a Palavra. Se nossa própria regeneração não é suficiente para apontar Jesus para uma pessoa, façamos como a mulher samaritana, e convidemos as pessoas a elas mesmas terem contato com Jesus.

Aquelas pessoas então vão em direção à Jesus, diante do anúncio da mulher samaritana de que Ele era o Messias esperado. Neste meio tempo, os discípulos solicitam a Jesus que pare o que estava fazendo para se alimentar. Até aquele momento Jesus não havia se alimentado, e possivelmente não havia matado a Sua sede, tendo em vista que a mulher samaritana deixou seu cântaro e correu para cidade. 

A resposta de Jesus foi que Ele tinha comida para se alimentar naquele momento, mas os discípulos não conheciam. E de fato os discípulos não compreendiam o que Jesus falavam, tendo em vista que ficaram se questionando se alguém havia levado comida para eles enquanto estiveram fora, e por isso não era mais necessário comer. Nesse momento, Jesus os responde que a comida dele era fazer a vontade do Pai e realizar a obra à qual seu ministério estava proposta.

Jesus está  nos dando a terceira lição: Fazer a vontade de Deus é uma necessidade maior do que as nossas próprias necessidades pessoais. 

Jesus não está impondo aos seus discípulos que fizessem rigorosos jejuns de comida ou bebida, nem estava estabelecendo que deveriam ficar sem comer. Jesus está mostrando para seus discípulos que a necessidade dos samaritanos era espiritual e urgente, enquanto as dele eram secundárias. Como humano, Jesus poderia ficar dias sem comer ou beber, como outrora fizera no deserto enquanto fora tentado por Satanás, sem com isso morrer. Os samaritanos, por outro lado, estavam mortos em delitos e pecados, e precisavam urgentemente nascer de novo. Os discípulos queriam que Jesus deixasse aquelas pessoas esperando enquanto ele comia, mas para Jesus, alimentar espiritualmente as  pessoas era mais importante. 

Precisamos ter esse senso de urgência que coloca a missão do cristão acima das suas volições e anseios. Na prática muitas vezes vemos o chamado cristão para o evangelismo e pregação ser colocado de lado em decorrência de necessidades aparentemente mais urgentes como trabalhar, concluir uma carreira acadêmica, gerir nossos relacionamentos pessoais, ter momentos de lazer, etc.

É para nos fazer refletir o que é mais importante quando estamos a caminho de um passeio no fim de semana e recebemos uma ligação de uma pessoa precisando da nossa companhia; para refletir quando separamos dinheiro para pedir uma pizza e tomamos conhecimento das necessidades de um missionário; ou aquele momento em que estamos atrasados ou apressados para qualquer coisa e uma pessoa em situação de rua pede nossa atenção. Você para, olha a pessoa nos olhos enquanto ela fala, mesmo sabendo que muitas vezes ela só quer pedir dinheiro? Ou então você a interrompe com rispidez ou joga dinheiro imediatamente em suas mãos, como se fosse essa a única necessidade daquela pessoa?

Certa vez presenciei durante um culto a entrada de um morador de rua na igreja, e durante a ministração do louvor um dos cantores que estava no púlpito pediu para demonstrarmos nossa alegria e comunhão através de cumprimentos e abraços. Entristeci-me ao constatar que mesmo as pessoas na mesma fileira de cadeiras daquele senhor não se dispuseram sequer a apertar a mão daquele homem. 

Via-se que não era "só mais um bêbado", pois o homem estava lúcido, não cheirava a álcool, mas apresentava mal cheiro intenso, e percebia-se não só pelo odor como aspecto que ele de fato habitava nas ruas. Ele estava na última fileira da igreja, eu na terceira, e me desloquei até ele, apertei sua mão, olhei nos seus olhos e perguntei seu nome. Ele, com extrema alegria me disse seu nome... Gustavo. Então ele agradeceu por eu ter perguntado o nome dele, sorriu, e o culto seguiu normalmente.

E se minhas roupas tivessem sujado? - Em casa eu as poderia lavar.

Ele estava sujo, poderia me contaminar com alguma bactéria ou vírus. - Eu poderia discretamente lavar as mãos em algum momento, sem levá-las à boca ou olhos.

Eu poderia ficar fedendo? -  Dificilmente, mas caso ocorresse, seria por muito pouco tempo comparado àquele homem.

Mas aquele culto poderia ser a última oportunidade daquele homem experimentar o calor da comunhão do corpo de Cristo. Poderia ser a oportunidade dele sair dali quebrantado pela Palavra e pelo acolhimento, ao invés de sair decepcionado, nos acusando de tratá-lo como se fosse menos humano que qualquer um. A necessidade daquele homem era maior do que qualquer coisa que nós pudéssemos alegar para nos mantermos afastados dele naquele momento.

Isso se confirma pela afirmação de Jesus, ao comparar o que estava ocorrendo com a ceifa que estava para acontecer. O tempo de ceifar as colheitas estava previsto para ocorrer daqui há quatro meses, e Jesus se aproveita disso para chamar a atenção dos seus discípulos.

Neste momento ele nos traz o quarto ensinamento: O tempo da colheita é agora.

Enquanto eles esperavam quatro meses pela colheita, ela já estava pronta para ser realizada. Jesus estava dizendo que a sua fome era de realizar a vontade do Pai, a semente que havia sido lançada no coração daqueles samaritanos já estava pronta para ser colhida naquele momento. Aquela era a hora de pregar o Reino de Deus e promover os batismos. 

A mensagem da mulher samaritana não demandaria meses para surtir efeitos, através do ensino da Palavra programático, de enviar um discípulo para passar meses com os samaritanos... O momento era aquele. Aliás, a semente em si já fora plantada desde o Pentateuco que os samaritanos consideravam como texto bíblico. A chegada de Jesus em Sicar era o momento da colheita dos frutos decorrente da Lei que previa a vinda do Messias. Quando Jesus declara que Ele era o Messias, estava realizando a colheita decorrente da semente plantada na Palavra. 

E o que ceifa recebe galardão, e ajunta fruto para a vida eterna; para que, assim o que semeia como o que ceifa, ambos se regozijem.

Porque nisto é verdadeiro o ditado, que um é o que semeia, e outro o que ceifa.

Eu vou enviei a ceifar onde vós não trabalhastes; outros trabalharam, e vós entrastes no seu trabalho.

Por fim, Jesus nos dá o quinto ensinamento: a função dos seus discípulos deve ser pregar o Reino, vejam o resultado ou não.

Quando Cristo declara que seus discípulos ceifam o que não plantaram, Ele está declarando a verdade do Evangelho pela qual compete a cada cristão pregar Jesus Cristo, e ter isso como sua única preocupação. Os discípulos estavam colhendo os frutos da pregação da Lei e dos profetas, e nós, hoje, colhemos os frutos que muitas vezes não fomos os responsáveis por plantar. Eles continuaram o trabalho que não haviam começado, e nós também fazemos isso.

Jesus também está falando sobre galardão que é ajuntado para vida eterna, deixando claro que tanto aquele que semeia quanto aquele que colhe se regozijam  nos frutos para vida eterna. O galardão portanto é apresentado como um benefício dado por Deus aos homens por sua graciosa vontade de ser abençoador e galardoador daqueles a quem ama. Não há uma distinção entre quem planta e quem  colhe, e no fim das contas, todos devemos administrar nossos talentos com dedicação e alegria.





domingo, 23 de julho de 2023

Jesus e a mulher samaritana - Parte 02 (João 4:14-26)

Mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que salte para a vida eterna.

Disse-lhe a mulher: Senhor, dá-me dessa água, para que não mais tenha sede, e não venha aqui tirá-la.

Disse-lhe Jesus: Vai, chama o teu marido, e vem cá.

A mulher respondeu, e disse: Não tenho marido. Disse-lhe Jesus: Disseste bem: Não tenho marido;

Porque tiveste cinco marido, e o que agora tens não é teu marido; isto disseste bem: Não tenho marido;

Porque tiveste cinco maridos, e o que agora tens não é teu marido; isto disseste com verdade.

Disse-lhe a mulher: Senhor, vejo que és profeta.

Nossos pais adoraram neste monte, e vós dizeis que é em Jerusalém o lugar onde se deve adorar.

Disse-lhe Jesus: Mulher, crê-me que a hora vem, em que nem neste monte e nem em Jerusalém adorareis o Pai.

Vós adorais o que não sabeis; nós adoramos o que sabemos porque a salvação vem dos judeus.

Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem.

Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade.

A mulher disse-lhe: Eu sei que o Messias (que se chama o Cristo) vem; quando ele vier, nos anunciará tudo.

Jesus disse-lhe: Eu o sou, eu que falo contigo.

João 4:14-26



No sermão anterior ressaltamos a aproximação de Jesus da mulher samaritana, e como ele não perdeu a oportunidade para falar-lhe acerca do Reino de Deus. Vimos que Jesus desperta a curiosidade da samaritana ao mostrar para ela que as coisas desse mundo não satisfazem e são passageiras. Que a água do poço de Jacó não poderia satisfazer os desejos do seu coração.

Esse contraste é importante para nós, pois o poço de Jacó simbolizava a Antiga Aliança em contraste com a Nova Aliança em Jesus Cristo. As águas do poço saciavam a sede temporariamente, enquanto a água viva oferecida por Jesus era o derramar do Espírito Santo como torrentes sobre a terra seca, trazendo regeneração para vida eterna.

O dom do Espírito é uma fonte de água viva, ou seja, água corrente que nos conduz a vida eterna. Tomar dessa água mata a nossa sede pela eternidade, pois essa fonte jamais cessaria. 

Em primeiro lugar, Jesus confronta a mulher com seu próprio pecado.

Até esse momento a mulher ainda não tinha entendido que Jesus não estava falando de uma fonte de águas literal, de forma que solicita a Jesus que dê a ele dessa água, para que ela não precise mais buscar água no poço. Jesus então, solicita a mulher a presença do seu marido, lembrando-a da vida imoral que ela estava vivendo até então. 

Ainda assim, a mulher tenta ocultar a verdade, e responde a Jesus com uma meia verdade. Ela informa a Jesus que não tinha marido, mas não informa que vivia maritalmente com um homem que não era casado com ela. Talvez ela tivesse vergonha de admitir para um mestre judeu que estava vivendo de forma que desagradava a Deus. 

Jesus parabeniza a mulher por falar a verdade sobre não ser casada, mas deixa claro para ela que não adiantava omitir o seu pecado. Se essa mulher desejava a água viva, precisava reconhecer os seus pecados e a necessidade que ela tinha de Deus.

Em segundo lugar, Jesus ensina a mulher o que é a adoração verdadeira

A samaritana reconhece que Jesus tinha poder, e considera-o como um profeta. Jesus havia exposto a vida dela, e a fim de desconversar, a samaritana muda o foco da conversa para uma questão teológica. Para o samaritano, que só acreditava no Pentateuco, o local de adoração era uma questão controversa. Ela aproveita para tirar a sua dúvida, ao que podemos destacar os seguintes aspectos.

a) A adoração verdadeira não tem lugar específico

Os judeus haviam estabelecido Jerusalém como o local de adoração, enquanto os samaritanos tinham o costume de adorar nos montes. Jesus esclarece para essa mulher que era chegada a hora em que não importaria mais o local onde seria realizada a adoração. Aonde quer que o adorador esteja, ali será o local correto da adoração.

b) Adoração precisa ser feita com consciência

A adoração deveria ser feita em espírito e em verdade. Portanto, a adoração não se tratava de cerimônias ou locais sagrados. Não se tratava de cultos cheios de transe e coisas sem sentido. A adoração verdadeira é aquela realizada de forma consciente, por mais simples que seja. Jesus deixa isso evidente quando diz que os samaritanos  adoravam sem conhecer, mas que os judeus adoravam o que conheciam. Era necessário para mulher samaritana conhecer também, e saber que dos judeus vinha a salvação, pois o próprio Jesus Cristo era judeu.

c) A adoração deve ser feita exclusivamente a Deus

Jesus não parte da premissa que qualquer culta agrada a Deus, ou que qualquer outra criatura ou falso deus pudesse receber destaque ou atenção na adoração. Os verdadeiros adoradores são aqueles que adorarão a Cristo somente. Somente Deus deve ser adorado e somente a Ele o culto deve ser prestado.

d) Devemos adorar em espírito e em verdade: 

Jesus declara para aquela mulher que Deus é Espírito, e buscava verdadeiros adoradores que o adorassem em espírito e em verdade. O que Jesus quer deixar claro para essa mulher é que não era a liturgia e locais sagrados que importavam na adoração, tendo em vista que Deus não é preso a nenhum deles. O local de adoração não importava, pois Deus é onipresente; a liturgia também se tornava irrelevante; pois Deus é oniscente.

Não importava se os homens agiam corretamente na ordem do culto, se seus corações não estivessem sinceramente adorando ao Senhor. A devoção externa não era nada se espiritualmente aqueles que prestassem o culto estivessem mortos em delitos e pecados. Jesus está ensinando para essa mulher a verdadeira importância de crer e adorar a Deus, acima de qualquer liturgia e culto prestado. O Antigo Testamento possui diversas repreensões do Senhor, que demonstrou não se agradar com ofertas e holocaustos recebidos, por mais corretos que estivessem na sua execução. Isso porque o coração do povo estava distante dEle, ainda que seus lábios proferissem as santas palavras do texto bíblico.

Por último, Jesus desperta a fé verdadeira 

Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem.

Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade.

As palavras de Jesus despertam a mulher para fé verdadeira, e mesmo sabendo pouco acerca da Palavra, tendo em vista os limites da religião samaritana, ela se recorda do ponto principal da Lei. Ela se recordou que Deus prometeu enviar o Messias, o salvador prometido que anunciaria as novas coisas. 

Nesse momento Jesus se dá a conhecer a ela e revela que aquele Messias aguardado por judeus e samaritanos era Ele próprio. Não seria mais necessário aguardar para compreender como seria o caminho, pois o próprio Jesus já estava anunciando para ela como proceder e como obter a salvação. As palavras de Jesus confirmavam a Palavra escrita de tal forma que ao ouvir o Senhor falar, a mulher samaritana se recordou das promessas do texto bíblico acerca do Messias.

E como isso se aplica a nós?

Primeiro, não há como tomar dessa fonte de águas vivas sem uma confissão verdadeira dos nossos pecados.

Jesus oferece àquela mulher a fonte de águas vivas, mas antes disso confronta ela com seus próprios pecados. Para saciar a nossa sede, é preciso em primeiro lugar compreender que estamos sedentos de Deus. Um coração egoísta e autosatisfeito jamais vai entender que tem sede espiritual e precisa de Jesus. Um homem feliz em seus pecados recorrentes não vai querer tomar da água da vida se estiver bebendo de outras fontes às quais se recusa a abandonar.

Precisamos refletir no que há de errado em nossa vida, e buscar o perdão e correção. É necessário primeiro compreender que  necessitamos de Jesus em nossas vidas, do contrário, jamais receberemos o dom do Espírito. Se não cremos no que Jesus fez por nós, também não cremos na segurança da nossa salvação e nem no dom do Espírito que nos vivifica e purifica diariamente.

Segundo, o verdadeiro culto que prestamos ao Senhor é espiritual

Adorar ao Senhor não diz respeito ao que fazemos nas atividades da igreja no domingo e sim em viver sinceramente da forma que o agrada. Adoramos a Deus em espírito e em verdade, logo, adoramos a Deus com nossa vida espiritual. É a nossa disciplina no aprendizado e ensino da Palavra, a confissão dos nossos pecados, nossos momentos de oração, nosso desejo de glorificar a Deus em todas as coisas... O verdadeiro  culto que prestamos ao Senhor diz respeito à sinceridade e comprometimento que temos com o Senhor. Diz respeito às nossas intenções, e não às nossas ações. 

Terceiro, a fé verdadeira é aquela que confia em Jesus como o único salvador das nossas vidas

A razão pela qual as palavras de Jesus fizeram a mulher samaritana a lembrar da promessa do Messias é o que motiva a nossa fé. Podemos ter tanta confiança em Jesus Cristo como nosso salvador, porque basta olharmos para Sua vida que veremos o integral cumprimento da Palavra de Deus por ele. Se todo o necessário para redimir o pecado foi efetivamente realizado por Jesus, e cremos nisso, podemos também crer que todas as bençãos decorrente da obediência do nosso Senhor à Sua própria Palavra também foram efetivamente conquistadas.

Tanto a salvação quanto o dom do Espírito são realidades na nossa vida, que não podem ser perdidas ou questionadas se de fato cremos no que Cristo fez por nós. Isso decorre da própria autoridade da Palavra de Deus, que vincula ambas as coisas ao cumprimento da Lei efetuado pelo nosso Salvador. Não são das nossas ações que elas decorrem, mas das ações de Jesus Cristo. Confiamos que somos salvos e santos não porque somos capazes de nos salvar ou santificar, mas porque sabemos que Cristo foi capaz de conceder essas boas dádivas para nós. 

A fé verdadeira é aquela que não tenta conquistar a própria salvação ou subordina a qualidade da adoração de acordo com aquilo que se pode fazer ou adquirir; não é a fé que se mede por cargos ou boas ações; nem a fé que tenta constantemente ser medida pela capacidade de deixar de pecar. A fé verdadeira é aquela que olha pra Jesus, pras suas ações e palavras e declara: "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo".


sábado, 22 de julho de 2023

Jesus e a mulher samaritana - Parte 01 (João 4:1-14)

 E quando o Senhor entendeu que os fariseus tinham ouvido que Jesus fazia e batizava mais discípulos do que João 

(Ainda que Jesus mesmo não batizava, mas os seus discípulos), 

Deixou a Judéia, e foi outra vez para a Galiléia.

E era-lhe necessário passar por Samaria.

Foi, pois, a uma cidade de Samaria, chamada Sicar, junto da herdade que Jacó tinha dado a seu filho José.

E estava ali a fonte de Jacó. Jesus, pois, cansado do caminho, assentou-se assim junto da fonte. Era isto quase à hora sexta.

Veio uma mulher de Samaria tirar água. Disse-lhe Jesus: Dá-me de beber.

Porque os seus discípulos tinha ido à cidade comprar comida.

Disse-lhe, pois, a mulher samaritana: Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana? (porque os judeus não se comunicam com os samaritanos).

Jesus respondeu, e disse-lhe: Se tu conheceras o dom de Deus, e quem é o que te diz: Dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva.

Disse-lhe a mulher: Senhor, tu não tens com que a tirar, e o poço é fundo; onde, pois, tens a água viva?

És tu maior do que o nosso pai Jacó, que nos deu o poço, bebendo ele próprio dele, e os seus filhos, e o seu gado?

Jesus respondeu, e disse-lhe: Qualquer que beber desta água tornará a ter sede;

Mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que salte para a vida eterna.

João 4:1-14



No capítula anterior João Batista exalta o ministério de Jesus Cristo, ao saber através dos seus discípulos que ele vinha realizando batismos. Os batismos de Jesus já estavam causando discussões entre os judeus e os discípulos de João, e agora vemos que os fariseus haviam tomado conhecimento que Jesus estava realizando batismos com seus discípulos. O ministério de João Batista já incomodava os fariseus, que anteriormente já havia os exortado acerca da necessidade do arrependimento; o de Jesus, então, passara a ser ainda mais incômodo, na medida em que Jesus já havia feito mais discípulos e batismos que o próprio João.

A fim de evitar os fariseus, Jesus decide retornar a Galileia, passando por Samaria no caminho. A razão pela qual nosso Senhor fez isso, é porque ainda não era chegado o tempo de ser confrontado pelos fariseus, pois bem sabemos ser o grupo que detinha o poder político e financeiro para levar Jesus a julgamento e crucificação, como de fato ocorrera posteriormente. Cristo não temia os fariseus, mas ainda não era chegada a hora de confrontá-los. 

No caminho para Galileia, Jesus decide parar em Sicar para descansar o seu corpo e matar a sua sede enquanto seus discípulos saíram para comprar mantimento.  Neste meio tempo uma mulher vem até a fonte de Jacó e Jesus lhe pede água. Para compreender as aplicações dessa passagem, precisamos destacar algumas questões.

Em primeiro lugar, Jesus começa a conversar com uma mulher samaritana. 

Precisamos entender que no tempo de Jesus um homem não poderia conversar com uma mulher publicamente. As conversas com mulheres solteiras ocorriam em ambientes familiares, de forma supervisionada, e mesmo assim o homem pouco se direcionava para mulher. Já as mulheres casadas, só poderiam dialogar com outros homens com a presença e autorização do seu próprio marido. Um homem que abordava uma mulher para conversar em lugares públicos, como as fontes de água de uma cidade estava em busca de uma prostituta.

Os samaritanos eram um povo odiado pelos judeus, pois era composto por descendentes de judeus e povos pagãos com os quais não deveriam se unir. Era um povo responsável por contaminar o culto a Deus com cerimônias e práticas pagãs. Se já era inesperado que um homem judeu abordasse uma mulher na rua, muito mais se essa mulher fosse samaritana.

É por essa razão que a mulher responde a Jesus asperamente a Jesus, pois o ódio dos judeus pelos samaritanos era de conhecimento comum. A resposta agressiva dela ao pedido de Jesus não era resultado de má índole e de um tratar-se de uma pessoa ruim; e sim do pecado de um coração rancoroso e na defensiva. Após anos de estigma e preconceito muitas vezes podemos não perceber que nós mesmos nos colocamos em posição de estigmatizar e sermos preconceituosos. Repetimos todo comportamento agressivo que recebemos dos outros.

Em segundo lugar, Jesus se apresenta como aquele que pode saciar as verdadeiras necessidades das pessoas. 

Nosso Senhor tinha sede, mas diante da resposta daquela mulher samaritana, Ele deixa suas próprias necessidades temporariamente para saciar a maior necessidade daquela mulher. Enquanto Jesus precisava saciar sua sede de água, aquela mulher precisava saciar a sua sede da compaixão e do amor de Deus. Jesus tinha sede, e não recebeu água; aquela mulher recebeu da graça de Deus sem sequer saber que tinha sede dela.

A resposta de Jesus à mulher não é uma ameaça, como se estivesse lamentando o destino que ela sofreria por ter recusado água a ele. Afinal, Jesus conhecia aquela mulher e toda a sua vida, e o que ele desejava era instigar a mulher acerca de quem Ele era. Jesus estava apresentando a si mesmo como a fonte de águas vivas.

A mulher de início não entende do que Jesus está falando, e acredita que Ele está dizendo possuir uma fonte literal de águas melhor do que a fonte que saciou a sede do próprio Jacó! Ela duvida de Jesus, afinal, Ele sequer tinha um balde, e até poucos minutos antes havia pedido água para ela.  Ela questiona o nosso Senhor declarar poder oferecer água melhor do que aquela oferecida pelo próprio Jacó, do qual judeus e samaritanos descenderam diretamente ou por mistura com povos estrangeiros.

Jesus responde ao questionamento da mulher declarando que a água daquele poço, por mais excelente que fosse o seu dono, não deixava de ser água. Ela não promovia cura, não tinha propriedades milagrosas ou qualquer outra função diferente daquela que teve para o próprio Jacó: matar a sede. A água continuava a ser água, não importava de qual profeta ou patriarca ela pudesse ter sua origem.

Mas as águas de Jesus, diferente de todas as demais, podem saciar a sede por toda a eternidade. Isto porque fome e sede são sensações temporárias que decorrem de necessidades fisiológicas. Já o relacionamento com Deus é uma necessidade atual que permanece por toda a eternidade. Aquela mulher poderia saciar a sua sede temporariamente até os seus últimos momentos de vida; porém a sua sede do amor de Deus não poderia ser saciada jamais, a menos que ela tomasse das águas de Jesus Cristo.

A nossa morte espiritual faz do nosso coração solo infértil no qual a vida eterna jamais poderá nascer e fluir. Não existe vida em nós, e precisamos ser regados pelo Espírito Santo através da fé em Jesus Cristo. Jesus precisa fazer fluir em nós o Espírito que vivifica e santifica os homens, convencendo-os da justiça, do pecado e do juízo, para que enfim possam obter a vida eterna. Sem  que ocorra a regeneração, o homem permanece estéril e morto espiritualmente. Com a regeneração, as águas vivas do Senhor nos lavam dos nossos pecados e deixam nossos corações limpos para o Espírito Santo fazer morada. 

E como isso se aplica a nós?

1º Precisamos compreender que para Deus todos nós somos igualmente carentes da Sua Graça.

Ao pregar para uma mulher samaritana, Jesus passa por cima de todas as barreiras culturais e sociais, e demonstra que a salvação é necessária para homens e mulheres; ricos e pobres; judeus e samaritanos. Isto porque todos pecaram e carecem da glória de Deus. Todos os homens, sem distinção, precisam ser salvos e se arrependerem dos seus pecados.

2º Muitas vezes corremos o risco de refletir no outro o nosso sofrimento

Da mesma forma que a mulher samaritana era hostilizada pelos judeus por ser samaritana, ela passa a hostilizar o próprio Jesus por ser judeu. Precisamos estar atentos para descontar no próximo as nossas próprias frustrações, traumas e sentimentos. Quando nos colocamos na defensiva perdemos a oportunidade de ser benção na vida do nosso próximo.

3º Precisamos aproveitar todas as oportunidades para pregar a Palavra de Deus.

Esse episódio com a mulher samaritana ocorre antes do início do ministério de Jesus junto aos gentios. Entretanto, ainda que o objetivo principal de Jesus nesse momento fosse pregar para os judeus, Ele jamais deixaria de aproveitar a oportunidade que surgiu em sua passagem por Samaria para livrar as pessoas do domínio do pecado. 

O ministério do nosso Senhor Jesus é salvar vidas, e ainda que tencionasse pregar primeiro para judeus, jamais deixaria de estender a mão para gentios, tendo em vista que não fazia acepção de pessoas.  Isto se confirma posteriormente, quando vemos que diversos samaritanos são convertidos com a pregação do próprio Jesus.

domingo, 16 de julho de 2023

É preciso crer no Filho (João 3:36)

A excelência do ministério de Jesus (João 3:31-35)



 Aquele que vem de cima é sobre todos; aquele que vem da terra é da terra e fala da terra. Aquele que vem do céu é sobre todos.

E aquilo que ele viu e ouviu isso testifica; e ninguém aceita o seu testemunho.

Aquele que aceitou o seu testemunho, esse confirmou que Deus é verdadeiro.

Porque aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus; pois não lhe dá Deus o Espírito por medida.

O Pai ama o Filho, e todas as coisas entregou nas suas mãos.

João 3:31-35

O capítulo 3 aborda uma discussão que havia começado entre os discípulos de João e os judeus, acerca da purificação. Nesse contexto, os discípulos de João Batista relatam para o profeta que Jesus estava realizando batismos, e ele declara estar alegre com isso, assim como o amigo do noivo se alegra com sua felicidade durante o casamento, afinal, importava que de fato o ministério de Jesus Cristo se destacasse. Em sua defesa do ministério do nosso Senhor Jesus Cristo, o profeta João Batista nos deixa os seguintes ensinamentos:

Em primeiro lugar, Jesus Cristo é soberano e verdadeiro 

João inicia a perícope com a afirmação de que Jesus Cristo vem das alturas é por esta razão Ele está sobre todos. Ele faz uma verdadeira distinção acerca do que Jesus poderia fazer no tocante à purificação, e no que ele mesmo e qualquer outro homem poderiam fazer. Ele está afirmando que o ministério de Jesus Cristo está acima do dele próprio e de qualquer outro homem. Importava, portanto, que os homens buscassem o batismo de Jesus Cristo e de fato atentassem para os Seus ensinos.

O nosso Senhor é aquele que vem das alturas, e, estando acima de todos e testificando acerca das coisas que viu e ouviu do próprio Pai ele poderia de fato declarar aos homens toda a verdade acerca da purificação e da reconciliação com Deus. João Batista, por outro lado, era da terra e falava acerca das coisas da terra, ou seja, todo seu ministério se limitava àquilo que poderia fazer e ele mesmo testificar. João Batista poderia falar sobre as expectativas da chegada do Messias, sobre moral e ética, sobre pecado e arrependimento; mas jamais poderia fazer afirmações completas sobre o caminho para os céus, sobre a salvação, as expectativas de Deus para os homens e o novo nascimento.

João e os demais aguardavam a chegada do Messias que pisaria a cabeça da serpente e faria a reparação da relação com Deus rompida no Jardim do Éden. Pouco mais do que isso poderia ser asseverado, e havia muita confusão e teses de como isso seria realizado. Era comum, inclusive, acreditar que o Messias viria como um grande Rei que derrubaria os impérios e reis com mão forte. Acreditava-se que toda Israel herdaria o Reino dos Céus por ius sanguinis (direito de sangue).

Jesus Cristo então acaba com todas as dúvidas e especulações, declarando que Ele mesmo é o Caminho, a Verdade e a Vida, e que o Reino dos Céus não é desse mundo. Ele ensina que quem nEle crer terá a vida eterna, independentemente de ser judeu ou gentio.

Em segundo lugar, o ministério de Jesus testificava a verdade de Deus

Havia ainda outra diferença entre o ministério de Jesus Cristo e o de João Batista, e dizia respeito ao testemunho da verdade de Deus. João declara para seus discípulos que ninguém aceitava o testemunho de Jesus Cristo, e isso encontra respaldo nas razões já citadas acima. Por outro lado, aqueles poucos que criam em Jesus certificavam que Deus é Verdadeiro.

Nessa distinção, negar o ministério de João Batista correspondia a negar as palavras do profeta, enquanto negar o ministério de Jesus Cristo correspondia à negar as palavras do próprio Deus. Ao homem que negasse João, outras oportunidades de testificar a verdade de Deus poderiam ser concedidas, tais quais a ação do próprio Espírito Santo através do ouvir a pregação de Jesus. Por outro lado, ouvir as palavras de Jesus Cristo e negar-lhe a verdade corresponde a efetiva e integral incredulidade. 

Essa distinção era de fato importante naquele contexto, pois alertava aos discípulos de João Batista que eles precisavam ser, antes de tudo, discípulos do próprio Jesus Cristo. Alertava que as palavras de João poderiam falhar, mas as de Jesus jamais falhariam. João poderia ter dúvidas, como de fato as teve posteriormente, mas Jesus Cristo era detentor da verdade de Deus e das certezas.

Em terceiro lugar, o ministério de Jesus é pleno e constante

A terceira distinção feita por João Batista corresponde à natureza do ministério do profeta, suas palavras e ações. Enquanto João Batista, como homem, recebia da autoridade do Espírito Santo em momentos específicos e para assuntos específicos, tais quais preparar o caminho para vinda do Messias; o próprio Jesus Cristo possui a plenitude do poder de Deus em todos os momentos.

João declara que Jesus não recebeu o Espírito por medida, em alusão à operação do Espírito Santo na vida dos homens. No Antigo Testamento nós vemos que a ação do Espírito num homem ocorreu em alguns momentos específicos da história, e de forma temporária. O Espírito Santo realizava uma determinada tarefa através do homem, e depois o deixava.

Jesus, por outro lado, não falava temporariamente através da ação do Espírito Santo, pois Ele mesmo possuía a autoridade para falar a Verdade. Ele veio dos céus, e não era um mero mediador da Palavra, um profeta como qualquer outro. João declara para seus discípulos que o Pai amava Jesus Cristo e entregou todas as coisas a Ele. Então Jesus não precisava aguardar o derramamento do Espírito Santo para dar autoridade em Seu ministério, pois Ele tem a autoridade sobre todas as coisas. Ele poderia ensinar o caminho ao Pai, a purificação e a salvação, pois ele mesmo detinha todas as coisas.

domingo, 11 de junho de 2023

Jesus purifica o Templo - João 2:12-22

Depois disto desceu a Cafarnaum, ele, e sua mãe, e seus irmãos, e seus discípulos; e ficaram ali não muitos dias.

E estava próxima a páscoa dos judeus, e Jesus subiu a Jerusalém.

E achou no templo os que vendiam bois, e ovelhas, e pombos, e os cambiadores assentados.

E tendo feito um azorrague de cordéis, lançou todos fora do templo, também os bois e ovelhas; e espalhou o dinheiro dos cambiadores, e derribou as mesas;

E disse aos que vendiam pombos: Tirai daqui estes, e não façais da casa de meu Pai casa de venda.

E os seus discípulos lembraram-se do que está escrito: O zelo da tua casa me devorou.

Responderam, pois, os judeus, e disseram-lhe: Que sinal nos mostras para fazeres isto?

Jesus respondeu, e disse-lhes: Derribai este templo, e em três dias o levantarei.

Disseram, pois, os judeus: Em quarenta e seis anos foi edificado este templo, e tu o levantarás em três dias?

Mas ele falava do templo do seu corpo.

Quando, pois, ressuscitou dentre os mortos, os seus discípulos lembraram-se de que lhes dissera isto; e creram na Escritura, e na palavra que Jesus tinha dito.



Introdução

Cristo havia se deslocado de Cafarnaum para Jerusalém por causa das festividades judaicas da Páscoa. Chegando no templo Jesus o Senhor se depara com ele repleto de cambistas e vendedores oferecendo todos os produtos e animais necessários para realizar holocaustos. Jesus então começa a derrubar as mesas e expulsar animais e cambistas com um azorrague de corda. Naquele momento um único homem, consumido pelo seu zelo, expôs a sua própria vida à risco de ser espancado ou até mesmo morto.

Mas por que a presença dos vendedores incomodou a Jesus?

Num primeiro momento podemos estranhar a reação de Jesus diante dos vendedores no templo, afinal, não estavam oferecendo nada ilícito. Pelo contrário: ofereciam tudo que seria necessário para que uma pessoa no templo oferecesse holocaustos e sacrifícios. Pessoas não precisariam se preocupar em procurar animais perfeitos ou correr o risco deles se perderem, serem roubados ou mortos no caminho. Bastava se deslocar até o templo e comprar tudo o que fosse necessário.

O problema se dá em transformar o local de adoração ao Senhor em um negócio. Os cambistas não estava na circunvizinhança do templo, e sim dentro dele. No local onde as pessoas deveriam estar louvando e dedicando devoção ao Senhor havia dinheiro, animais e diversas mesas ocupando todo o espaço. A presença dos cambistas impedia o acesso de todos os templo, e, ao invés do som de louvores, o que se ouvia eram vendedores gritando e fazendo ofertas.

As ações de Jesus também eram um cumprimento da Palavra de Deus. Em Salmos 69:7-9 Davi declara:

Porque por amor de ti tenho suportado afrontas; a confusão cobriu o meu rosto. 

Tenho-me tornado um estranho para com meus irmãos, e um desconhecido para com os filhos da minha mãe.

Pois o zelo da tua casa me devorou, e as afrontas dos que te afrontam caíram sobre mim.

Não se tratava de um acesso de raiva destrutiva e desmotivada, e sim do cumprimento da Palavra de Deus, na qual Jesus demonstra à todos que o amor à Deus e Sua Santidade, e o zelo pelo que é santo precisa ser maior do que as afrontas e ameaças que qualquer um poderia proferir. Os discípulos naquele momento viram em Jesus o verdadeiro testemunho da fé, que sobressai ainda que haja risco de vida, afrontas ou humilhação.

Jesus não estava preocupado se poderia ser morto ou espancado. Estava preocupado com que o Templo de Jerusalém fosse um local de santa adoração, no qual as pessoas pudessem encontrar o ensino da Palavra, e colocar-se diante de Deus. 

Jesus, como o Filho de Deus, não poderia permitir que o Templo fosse transformado em um negócio. A intenção daqueles cambistas não era de forma alguma glorificar ao Senhor, e sim lucrar com o nome de Deus. Estavam preocupados apenas com o seu próprio bem estar.

Por que o Senhor Jesus não deu àqueles homem um sinal de ser o Filho de Deus?

A ação de Jesus chamou a atenção dos cambistas, que ficaram perplexos com o que estava acontecendo. Os judeus diante das ações de Jesus questionaram com qual autoridade faziam tais coisas. Consideraram a possibilidade de Jesus ser um profeta, tendo em vista que o Antigo Testamento apresenta diversos atos proféticos que para nós homens são complexos, mas que na razão de Deus tem um objetivo didático. Podemos tomar como exemplo o profeta Isaías, que por 3 anos descalço e despido das suas vestes (Isaías 20:3).

Aqueles homens consideraram que ninguém seria louco de mexer com pessoas tão poderosas a menos que tivessem autoridade para fazê-lo. Havia a possibilidade de que Jesus fosse um profeta, e então as Suas ações seriam justificáveis, e não poderiam fazer nada contra Ele. Para ter certeza disso, pediram a Jesus que desse um sinal de que possuía autoridade pra fazer isso.

Jesus, por outro lado, nega um sinal àqueles homens, declarando que caso derrubasse o templo, em três dias Ele seria capaz de reconstruir. Então aqueles homens responderam ter sido necessário 46 anos para reconstrução do Templo de Jerusalém, pois entenderam que Jesus estava realmente falando do Templo de Jerusalém. O que eles não compreendiam é que Jesus Cristo estava falando acerca de Si mesmo.

Nosso Senhor estava dizendo que mesmo que aqueles homens pudessem atacá-lo pelo que Ele fez, e tirar a Sua vida, isso não importaria, pois Ele ressuscitaria. Jesus estava declarando que nenhum sinal seria dado àqueles homens a não ser a Sua própria ressurreição. Jesus está colocando aqueles homens em pé de igualdade com os fariseus e escribas que cobraram dEle um sinal, tendo recebido como resposta que uma geração má e adúltera não receberia qualquer outro sinal senão o sinal do profeta Jonas, que esteve três dias e três noites no ventre do grande peixe (Mateus 12:39-40).

Jesus Cristo está declarando que Ele não tem nenhum interesse ou obrigação de provar nada a qualquer ímpio. A incredulidade daqueles homens diante do Filho de Deus lhes seria imputada como injustiça, e sua aprovação de nada importava. Jesus não estava ali para convencer ninguém através de sinais, mas deixou para Seus verdadeiros discípulos a lembrança das Suas Palavras, quando tempos depois elas se cumpriram na crucificação e ressurreição.

Naquele momento ninguém compreendia por que Jesus falava da destruição do templo, nem mesmo Seus discípulos; mas tempos depois Suas palavras fizeram sentido, e serviram para fortalecer a fé nas Escrituras e no próprio Jesus.

E quais lições ficaram para nós?

Em primeiro lugar, igreja não é comércio. Precisamos estar conscientes e conscientizar as pessoas a nossa volta de que a igreja de Cristo é um local de adoração ao Senhor. Estamos cercados de mercadores da fé, prontos para vender objetos ungidos em troca de bençãos da parte de Deus. Tudo isso é anátema, pois a igreja não é casa de venda. Deus nos ofereceu tudo sem cobrar nenhum preço por isso, Ele não precisa do nosso dinheiro pra agir em nosso benefício. Não podemos tentar comprar o favor de Deus.

Em segundo lugar, não devemos ficar cobrando sinais da parte de Deus para depositar ou medir a nossa fé. Entenda que ficar cobrando sinais é postura de quem não tem fé. Quando confiamos em alguém, não ficamos a todo tempo cobrando dessa pessoa sinais de que podemos confiar nela. Com Deus é a mesma coisa. Não podemos ficar cobrando sinais de Deus a todo momento porque somos incapazes de confiar no agir dEle.

Veja que mesmo quando não compreendemos ou entendemos, Deus está operando a Sua obra, e nós só precisamos confiar. Os discípulos não entenderam no momento o que Jesus quis dizer com a destruição e  reconstrução do Templo, mas tempos depois quando nosso Senhor ressuscitou, todos eles compreenderam e foram edificados.

Em terceiro lugar, o que é verdadeiro e da parte de Deus é confirmado pela Sua Palavra. Quando Jesus falava, seus discípulos conseguiam identificar o cumprimento das Palavras do Antigo Testamento, e o que o próprio Senhor Jesus declarava, no tempo certo se cumpria. Isso nos ensina que devemos moldar nossas decisões e estar atentos à Palavra de Deus. Se você tem dúvida se suas ações ou decisões são do agrado do Senhor, questione primeiro se elas vão ao encontro da Bíblia. Se aquilo que você faz te deixa com a consciência de estar afrontando a bíblia, deixe de fazer. 

Isso porque o Espírito Santo nos habilita a compreender as nossas ações à luz da Palavra de Deus.  Por isso, precisamos tanto desenvolver o hábito de leitura da Palavra, como também o hábito da oração. A nossa vida deve estar a todo momento apontando pra Jesus Cristo, e o que sabemos do nosso Senhor foi deixado para nós na Sua Palavra.

O próprio Jesus declarou que não veio para abolir a Lei de Deus, mas para cumpri-la. E de fato o Senhor fez isso. E se mesmo Jesus viveu inteiramente de acordo com a Palavra, não tendo ensinado um evangelho que a dispensasse para nós,  não podemos fazer diferente dele. Precisamos viver de acordo com a vontade de Deus revelada nas Escrituras.


sábado, 10 de junho de 2023

As Bodas de Caná da Galiléia - João 2:1-11


 

As bodas de Caná da Galiléia

João 2 registra para nós o primeiro milagre do nosso Senhor Jesus Cristo, tendo sido realizado nas bodas de um casal de noivos de Caná da Galiléia. Maria, mãe do Senhor Jesus havia sido convidada, bem como Jesus e seus discípulos que com Ele estavam. 

O problema

Durante a festa de casamento o vinho acaba e a mãe de Jesus recorre a Ele.

Não é certo que Maria tenha buscado Jesus esperando que Ele realizasse algum milagre, até porque até aquele momento, Cristo ainda não havia realizado nenhum. É possível que recorrer a Cristo fosse a solução de Maria para consolar os noivos e amenizar o sofrimento e vexame de ter que encerrar a festa mais cedo. Ainda que seja uma possibilidade, afirmar categoricamente que Maria esperava um milagre seria extrapolar os limites do texto bíblico e invalidar as palavras do próprio João, que no final da perícope declara que foi neste momento que Jesus principiou os seus sinais.

Por outro lado, os defensores da tese que Maria esperava um milagre de Jesus afirmam que o relato de João declara que foi assim que Jesus principiou os seus sinais em Caná da Galiléia, interpretando que o Senhor teria realizado milagres em outras cidades, tendo inclusive discípulos. Como seria possível que Jesus tivesse discípulos se não tivesse demonstrado o Seu poder? 

Em que pese o respeito e até mesmo a boa argumentação dessa tese, o próprio capítulo 1 do Evangelho de João declara que os discípulos de Jesus o haviam seguido pelo testemunho de João Batista, que o declarou como o Cordeiro de Deus, o Messias. João preparou o caminho para o início do ministério de Cristo, tendo batizado diversos homens e testificado acerca de Jesus. Esse testemunho, conforme o relato bíblico rendeu frutos: André e Pedro. Os outros dois discípulos são apresentados como Filipe e Natanael, que atenderam ao chamado do próprio Senhor Jesus sem a realização de qualquer milagre.

A questão que pode nos deixar curiosos é por que o Senhor Jesus inicia os seus sinais e maravilhas com algo tão banal como uma festa de casamento. Podemos acabar nos perguntando por que isso era importante. Jesus Cristo, podendo ter "gastado" o seu primeiro milagre curando um enfermo, fazendo um cego enxergar ou um paralítico andar; resolve transformar água em vinho para uma festa. 

Precisamos compreender a importância da hospitalidade para o povo judaico. Ser hospitaleiro e tratar bem ao próximo era um dever ético e moral, e a falta de hospitalidade era causa de vergonha e uma questão de extrema gravidade. Quando olhamos para o Antigo Testamento nós vemos que a hospitalidade ia além de tratar bem ao visitante, e também implicava no cuidado integral das necessidades daqueles que estavam em sua casa. Ló, por exemplo, oferece suas duas filhas aos homens de Sodoma para proteger os anjos do Senhor enviados a sua casa; Labão recebeu Jacó em sua casa por um mês. 

Pela cultura do Antigo Oriente a hospitalidade era um dever que deveria ser dispensado mesmo aos desconhecidos, assegurando a ele cuidado e proteção durante três dias, e a hospitalidade é uma marca dos povos do deserto, onde era comum haver tribos de nômades. Por se tratar de uma questão de sobrevivência num ambiente perigoso e precário, a hospitalidade era inclusive uma questão legal, uma obrigação com força de lei. 

Não apenas uma questão legal, a hospitalidade era uma questão bíblica. O judeu deveria amar ao estrangeiro como a si mesmo (Lv 19:34), e diversos preceitos bíblicos visavam a proteção do estrangeiro, do órfão e da viúva, em atendimento ao dever de hospitalidade como um aspecto do amor ao próximo.

Tomando essas informações como ponto de partida, é compreensível a preocupação de Maria com o término do vinho durante a festa de bodas. O vinho era alimento necessário para o povo antigo, e ter acabado poderia causar vergonha e constrangimento ao casal, que poderia ser objeto de comentários maliciosos e críticas. O casal no seu momento de maior alegria, celebrando o seu casamento poderia experimentar grande tristeza e constrangimento por não ter calculado direito as necessidades dos seus próprios convidados; ainda mais considerando os indícios de serem de fato hospitaleiros e solícitos, tendo convidado para suas bodas não apenas Jesus Cristo, como também 4 discípulos. O fim do vinho seria o fim da alegria do casal e insatisfação de todos os convidados.

A resposta de Jesus e a reação de Maria

Maria demonstra a sua preocupação com o fim do vinho e recorre imediatamente ao seu filho. Jesus, por outro lado, não demonstrou qualquer afetação. Ela demonstra sua total preocupação e recebe como resposta "Mulher, que tenho eu contigo? Não é chegada a minha hora."

Não foi uma resposta desrespeitosa e muito menos um fora dado pelo Filho de Deus na Sua  própria mãe. Cristo não estava dizendo que não se importava com o fim do vinho ou com a opinião da sua mãe, e nem que isso não era importante. Jesus disse exatamente o que foi dito: Não era chegada a Sua hora. Não era a preocupação de Maria e nem a urgência de repor o vinho que moveriam Jesus Cristo, e sim a Sua própria vontade e o Seu tempo para realizar os seus milagres. Jesus estava dizendo para sua mãe que não importava o quão nervosa e preocupada ela pudesse estar, o tempo de Deus é perfeito, e Seu agir não seria antecipado.

Tanto esta é a chave para compreender essa passagem, que a resposta de Maria ao seu filho foi dizer aos serventes que fizessem tudo que Ele mandasse. Maria não ficou ofendida, mas compreendeu que Jesus estava dizendo para ela não ficar ansiosa e tentar antecipar as ações e conselhos do Filho de Deus. Ela deveria confiar no seu filho.

Longe de ser uma questão irrelevante, vemos o quanto essa passagem é necessária até mesmo hoje, quando nos deparamos com doutrinas como a Mariologia, que inclui Maria como agente ativa na salvação dos homens, agindo como intercessora perante Jesus. Os homens, portanto, poderiam interceder a Maria, e ela, como mãe, intercederia por nós ao Filho.

A fala de Jesus está mostrando para nós que a preocupação e palavras de Maria não moveriam o Senhor quanto ao seu tempo e intento. O pedido de Maria não anteciparia o tempo de Jesus, mesmo diante da urgência em suprir as necessidades do casal. Ela intercedeu pelo casal de noivos, e isso nada adiantou para mudar os planos do Senhor Jesus.

O primeiro milagre

Ao seu tempo, Jesus Cristo ordena aos servos no casamento que enchessem as talhas de pedra utilizadas para o ritual de lavagem com água. Haviam seis delas, e cada uma delas poderia comportar de dois a três almudes, uma unidade de medida que variou bastante ao longo do tempo. As seis talhas no seu total poderiam ter armazenado de 150 a 200 litros de água. O nosso Senhor Jesus Cristo proveu o casal que nada tinha com bastante abundância. 

Não apenas a benção foi abundante, como acima de tudo era maravilhosa. O mestre-sala elogia o noivo por ter deixado o melhor vinho para o final. Se o melhor vinho era servido no início do casamento, e o vinho de pior qualidade servido ao final, isto significava que o vinho do milagre de Jesus era extraordinário. Era melhor que o melhor que o casal poderia oferecer aos seus convidados.

Mais importante do que isso é compreendermos que os milagres de Jesus sempre apontam pra obra dEle na nossa vida. Ele curava enfermos e expulsava demônios demonstrando que de fato era o Senhor que nos libertaria do pecado e sararia nossas enfermidades físicas e espirituais, Ele dava ordens aos mares e ventos demonstrando ser Senhor sobre toda a terra. Os seu milagres a todo momento demonstravam aos homens que Ele era o Filho de Deus, o Cordeiro que tira o pecado do mundo!

As talhas de pedra eram utilizadas pelos judeus nos rituais de purificação, para lavar mãos e pés e se purificar quando necessário. O milagre é didático: á agua das talhas de pedra não seriam necessárias para purificar os homens, pois Cristo mesmo seria aquele que nos purificaria de todos os nossos pecados de uma vez por todas. Cristo substituiria a água da purificação pelo seu próprio sangue derramado na cruz. Vemos posteriormente o Senhor Jesus instituir na Ceia do Senhor o vinho como a representação do Seu próprio sangue.

E quais lições essa passagem deixa para nós?

Em primeiro lugar, Jesus Cristo é a nossa salvação, nossa provisão e a nossa alegria. As talhas de água serviam para purificação; o vinho era uma provisão necessária para vida diária e também um meio de alegria nas celebrações. Ao transformar a água das talhas em vinho, Jesus está simbolizando a Sua própria obra por nós. Logo, em Jesus encontramos não apenas a fonte da nossa salvação, como também da nossa alegria.

O Senhor Jesus não apenas é a fonte de purificação dos nossos pecados, como também é o nosso contentamento. Não precisamos apenas ser gratos pela nossa salvação, como também devemos nos alegrar no nosso Senhor. Devemos nos contentar e celebrar a vida em Cristo, que nos salvou e transformou a nessa vida para sempre. Jesus é o Cordeiro que tira o pecado do mundo. Na cruz o Senhor pagou o preço definitivo do nosso pecado. O Seu castigo nos trouxe a paz e nos religou ao nosso Deus. 

Em segundo lugar, precisamos aprender a confiar e descansar no Senhor. Digo isto com base na resposta de Cristo para Maria. Nossas prioridades, urgências e ansiedade não vão antecipar num milésimo de segundo os propósitos e ações de Deus. Muitas vezes dizemos acreditar no tempo de Deus para as coisas na nossa vida, mas nos mantemos ansiosos e até mesmo tentamos conquistar o favor do Senhor na esperança de conseguir a ação imediata de Deus.

Precisamos compreender que mesmo quando somos incapazes de ver, Deus já está agindo em nosso benefício. Precisamos compreender que no tempo certo as bençãos do Senhor virão para nossa vida. Precisamos compreender que o que você considera urgente pode não ser urgente para Deus, e algo que você deseja, e deseja imediatamente, pode jamais ser dado a você. 

Precisamos aprender com Maria e diante das adversidades e problemas, respirar fundo e dizer: Seja feita a Sua vontade.

Em terceiro lugar, as bençãos do Senhor são maiores e melhores do que tudo que você possa tentar conquistar por suas próprias mãos. O Senhor Jesus não só proveu a necessidade do casal para o fim da festa, como o fez de forma abundante. Não só proveu o vinho, como proveu o melhor vinho da festa! Aquilo que o casal tinha a oferecer para os seus candidatos era bom, mas o que o Senhor Jesus tinha a oferecer era ainda melhor! Nós podemos ser felizes, nós podemos ser prósperos, podemos ser prodígios em diversas áreas da nossa vida, mas tudo isso é pequeno diante das bençãos do Senhor em nosso favor. Corremos e lutamos para conquistar as coisas diariamente, enquanto o Senhor Jesus nos oferece Seu amor e salvação gratuitamente, sem nenhum esforço da nossa parte.

Podemos correr atrás de festividades, relacionamentos, objetivos profissionais, desafios pessoais e nos contentar em todas essas coisas. Elas são boas e agradáveis. Mas ter Cristo na sua vida é ainda melhor. 

Em quarto lugar, a vida em Cristo não é letárgica e triste. Jesus Cristo, longe de ser um eremita contemplativo e asceta, estava presente em todos os momentos da vida humana.  Ele nos ensina que a vida cristã não é o desligamento do convívio com as pessoas a nossa volta em prol de viver autocontrole e atividades introspectivas de devoção. Jesus não estava apenas em montes e desertos orando e jejuando; ele também estava presente em casamentos e outras festividades. A própria relação do cristão com Jesus é retratada como as festas de bodas, onde noivo e noiva se alegram na sua união.

Cristo deseja que tenhamos sim momentos de reflexão, oração e jejum apenas na presença dEle; mas para ser piedoso não precisamos deixar de ser contentes, de festejar e ser alegres, de brincar e sorrir. Ser santo é ser piedoso, mesmo onde outras pessoas não são. Podemos estar em ambientes familiares e festas onde nem todos são cristãos, e nessa ação sermos a luz no meio da escuridão. Jesus Cristo sentava à mesa com pecadores, Ele não procurava a mesa dos fariseus e dos "mais santos". Ele estava com as pessoas, influenciando elas e confrontando-as com seus pecados.


E, ao terceiro dia, fizeram-se umas bodas em Caná da Galiléia; e estava ali a mãe de Jesus.

E foi convidado Jesus e os seus discípulos para as bodas.

E, faltando vinho, a mãe de Jesus lhe disse: Não têm vinho.

Disse-lhe Jesus: Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada a minha hora.

Sua mãe disse aos serventes: Fazei tudo quanto ele vos disser.

E estavam ali postas seis talhas de pedra, para as purificações dos judeus, e em cada uma cabiam dois ou três almudes.

Disse-lhes Jesus: Enchei de água essas talhas. E encheram-nas até em cima.

E disse-lhes: Tirai agora, e levai ao mestre-sala. E levaram.

E, logo que o mestre-sala provou a água feita em vinho (não sabendo de onde viera, se bem que o sabiam os serventes que tinham tirado a água), chamou o mestre-sala ao esposo,

E disse-lhe: Todo o homem põe primeiro o vinho bom e, quando já têm bebido bem, então o inferior; mas tu guardaste até agora o bom vinho.

Jesus principiou assim os seus sinais em Caná da Galiléia, e manifestou a sua glória; e os seus discípulos creram nele.

João 2:1-11

terça-feira, 23 de maio de 2023

Mandado Cultural - A relação do cristão com o mundo

Mandado Cultural

A relação do cristão com o mundo


Introdução

A bíblia nos ensina em Gênesis 1:26 que Deus fez o homem a sua imagem, conforme a Sua semelhança. Na prática a gente não pensa muito nisso, e a discussão sobre o que o Senhor quis dizer com isso acaba ficando muito restrita aos círculos de debate teológico, escolas dominicais e sermões expositivos. 

Ocorre que esse conceito é de extrema importância para nossa, e está longe de ser uma mera discussão e conceituação sem implicação prática. Compreender a imagem e semelhança de Deus vai nos ajudar a compreender o que é o mandado cultural, e nos tornar cristãos mais conscientes sobre nós mesmos e nossa relação com o mundo a nossa volta.

O homem à imagem e semelhança de Deus

Imagem (tselem) e semelhança (demût) são dois termos que aparecem na mesma frase, na qual o nosso Senhor informa o seu desígnio de criar uma nova criatura totalmente diferente de todas as demais. Esta nova criatura criada por Deus foi moldada pelo próprio Senhor, que soprou o fôlego de vida em suas narinas e lhe deu uma missão gloriosa. Essa nova criatura divergia das demais, porque ela carregava em si mesma a imagem de Deus. O homem, segundo essas palavras, é similar, porém não idêntico ao Deus que o criou, tendo recebido a tarefa de representá-lo no cuidado do Jardim do Éden.

Como bem se entende hoje, dizer que o homem carrega a imagem e semelhança de Deus significa que Ele foi criado com características do Senhor, para representá-lo em funções semelhantes às que o nosso Deus exerce dos altos céus. Com isso, carregar em si a imagem de Deus significa que o homem possui aspectos semelhantes ao do Senhor, tais quais:
  • Capacidade intelectual
  • Pureza moral (antes da Queda)
  • Natureza espiritual
  • Domínio sobre a terra
  • Criatividade
  • Capacidade de tomar decisões éticas
  • Imortalidade (antes da Queda)
  • Sociabilidade e comunhão
Mesmo a Queda foi incapaz de tirar do homem a imagem de Deus (Gn 9:6 c/c Tg 3:9), mas tirou dele a plena semelhança com o Senhor, tendo em vista que o caráter pecaminoso do homem é incompatível com a santidade de Deus. Assim, o homem carrega em si mesmo a imagem de Deus corrompida pelos seus próprios pecados. Moral, intelecto, vida espiritual; tudo se encontra corrompido pela Queda do homem.

O que são os mandados criacionais?

Embora a imagem de Deus em nós esteja distorcida pelo pecado, ainda representamos o Senhor naquilo que Ele determinou que caberia à humanidade efetuar.  Podemos dividir a forma como o homem representa Deus na sua relação com o cosmos utilizando os três mandados criacionais encontrados desde o início da história humana.
  1. Mandado cultural - o homem precisava cultivar e proteger o Jardim do Éden.
  2. Mandado social - o homem recebeu a ordem de crescer e multiplicar, constituindo família.
  3. Mandado espiritual - o homem precisava se relacionar com Deus.

O que é o mandado cultural?

A criação do homem à imagem de Deus tem como aplicação os mandados criacionais, sendo o primeiro deles o mandado cultural. Ele se realiza através do domínio e sujeição (Gn 1:28) e da guarda e cultivo (Gn 2:15). Basicamente homem e mulher deveriam governar, desenvolver e manter o cosmos através do seu trabalho, que não pode ser interpretado como castigo, mas como um privilégio e responsabilidade. Pelo mandado cultural, compete ao homem cuidar da criação e do seu próximo.

Recebemos do Senhor a missão de reger a criação, portanto, o homem deve se envolver em todas as áreas que impliquem necessariamente no seu dever original de cuidar da criação, tais quais:

  • Política
  • Comércio
  • Artes
  • Trabalho
  • Indústria
  • Tecnologia
  • Lazer
  • Ecologia

Como funciona na prática?

Levando em consideração tudo que já foi dito, fica claro que o mandado cultural está longe de ser um mero conceito. Nele consiste a base da relação do homem com tudo a sua volta.  Se o homem recebeu uma missão desde o Éden que compreendia cuidar do jardim do Senhor, isso mostra a nossa responsabilidade com tudo que ocorre à nossa volta.

É preciso entender como o pecado afetou não somente a imagem de Deus em nós, como também a nossa capacidade de representá-Lo no cuidado do universo. Veja que nosso pecado não afeta somente o planeta terra, e um exemplo muito simples dessa afirmação é o fato de que atualmente nós somos capazes de produzir lixo espacial composto pelo resto de satélites e espaçonaves que lançamos para fora do planeta.

O homem que deveria dominar e sujeitar a natureza com amor e zelo, atualmente o faz de forma predatória, sem qualquer preocupação efetiva com guardar e cultivar aquilo que diariamente consome e destrói para fins de lucro, poder, acumulação de riquezas. Animais e plantas que deveriam ser preservados acabam sendo extintos, o solo que deveria ser cultivado é explorado até se tornar infértil e as árvores que deveriam prover sombra, alimento e recursos são desmatadas violentamente.

Na prática, compreender o mandado cultural é compreender que Deus te deu uma missão desde o início dos tempos. Você precisa representar Ele na forma como interage com o universo a sua volta! Precisa combater os impactos do pecado na natureza a sua volta! Como cristão, você precisa ser um agente de transformação e preservação. Deus não te criou pra destruir tudo a sua volta para satisfazer seus próprios desejos, afinal, você é apenas um servo cuidando da propriedade do seu Senhor. 

É a luta por políticas públicas de preservação e proteção da natureza, seres vivos e outros seres humanos; é o comércio que não explora o mercado de consumo; é a preocupação com a ecologia, com o impacto da indústria no meio ambiente, na forma que as tecnologias afetam nossa relação com o universo. 

Mandado cultural não é só um conceito. É a forma como você se relaciona com o mundo.





sábado, 20 de maio de 2023

O testemunho de João Batista (João 1:15-18)

 "João testificou dele, e clamou, dizendo: Este era aquele de quem eu dizia: O que vem após mim é antes de mim, porque foi primeiro do que eu. E todos nós recebemos também da sua plenitude, e graça por graça. Porque a lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo. Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse o revelou."

João 1:15-18


A partir do momento que João nos apresenta a dupla natureza de Cristo e seus aspectos mais marcantes de vida e ministério, ele passa a escrever a história do ministério de Jesus. Nosso Senhor é apresentado como plenamente Deus (1.1-13), plenamente homem (1.14), e agora nos é apresentado como o Messias esperado (1.15). João Batista é o último profeta, pois ele é o último a profetizar a vinda do Messias (Mateus 11:11-13), sendo seguido pelo próprio Senhor Jesus pregando acerca de Si e do Reino de Deus.

A vida e ministério de João Batista tiveram como objetivo testificar acerca da vinda do Messias,  sendo ele a voz que clama do deserto e que endireitaria o caminho para chegada do salvador. João portanto nos é apresentado nesse texto como aquele que pregou e proclamou abertamente a vinda de Jesus, que iniciou seu ministério de ensino, pregação e martírio depois de seu primo. É por essa razão que o profeta declara que Jesus veio após ele, reconhecendo que mesmo sendo considerado um grande homem, sua vida e objetivo nada mais era do que preparar as pessoas para a vinda de Jesus.

Ainda que fosse alguns meses mais velho que nosso Senhor Jesus, João declara que Cristo foi primeiro do que ele. Isto porque o ministério de Jesus e sua obra de salvação não apenas estão decretadas desde o início dos tempos, como também desde o início todas as coisas foram feitas por meio dEle, e sem Ele nada existiria. No tocante ao ministério de salvação, o do nosso Senhor Jesus não inicia aos 33 anos de idade, após o seu primo, e sim já no seu nascimento, fazendo-se homem como nós, para ser capaz de nos representar na cruz.

Em seguida o autor bíblico afirma que todos nós recebemos da plenitude e graça por graça do nosso Senhor Jesus. Esse conceito de plenitude passa a ser o aspecto de destaque de todas as afirmações seguintes, conforme veremos a seguir.

Em primeiro lugar, recebemos da plenitude do nosso próprio Senhor Jesus. Isso significa que Jesus Cristo deu a si mesmo por completo para nós e em nosso benefício. Jesus foi plenamente verdadeiro acerca de Si mesmo e do Seu ministério, não tendo deixado nada oculto ou restrito para um determinado grupo, como os gnósticos gostavam de afirmar haver um conhecimento secreto de Jesus passado para um grupo restrito de cristãos mais elevados. Todas as coisas acerca de Jesus que os homens precisavam conhecer foram graciosamente reveladas a todos os homens.

Cristo não apenas se deu a conhecer plenamente a todos os homens, como também entregou a Si mesmo de forma integral, sofrendo a morte em nosso lugar. Ele não apenas compartilhou os seus ensinos, como também deu a Si mesmo para sofrer em nosso lugar. Nosso Senhor se entregou ao martírio, sendo torturado e sacrificado por nós.

Em segundo lugar, João declara que recebemos a plenitude e graça de Jesus por graça. É importante deixar claro essa informação, de que Jesus entregou a Si mesmo, completamente, não pelos nossos méritos e merecimento, tendo em vista que nada tínhamos para oferecer a Ele. Jesus se entregou por nós pela sua exclusiva misericórdia e bondade. A graça da nossa salvação nos foi concedida gratuitamente e sem merecimento algum. Mesmo a nossa obediência à Palavra não nos torna merecedores dessa salvação, pois a nossa carne é pecaminosa, e mesmo nossas boas ações podem esconder más desígnios e motivações.

Quando Adão pecou no Éden não havia qualquer mérito nas suas ações e palavras, e já naquele momento o Senhor determinou que enviaria o Seu Filho para reparar o erro do primeiro casal. Deus gratuitamente oferece a salvação para a humanidade condenada por Adão.

Em terceiro lugar, em Cristo está a plenitude da revelação. Os judeus justificavam a si mesmos nas obras com base na Lei. Moisés era estimado e considerado extremamente importante na religião judaica, por ser aquele a quem o próprio Deus revelou a Sua Lei para toda humanidade. Ao criar uma comparação entre Moisés e Jesus, João não está criando uma divisão entre Lei e Graça e Verdade, como se o próprio Moisés e demais pessoas antes da vinda de Jesus tivessem vivido uma mentira.

A Lei em si mesma já possui aspectos de graça, como a possibilidade de expiar por pecados através de um sistema sacrificial, determinações morais, civis e religiosas que demonstram o aspecto cuidadoso do Senhor em relação ao Seu próprio povo escolhido e até mesmo por demonstrar a necessidade de se apresentar santo diante do Senhor. A Lei dada por intermédio de Moisés era verdadeira, pois Deus não é homem para mentir, e nem conduziria Seu povo em engano. Ela servia não para salvar o homem, mas para mostrar ao homem sua necessidade de ser salvo. 

O que João está nos ensinando é que a plenitude da graça e verdade vieram através do Senhor Jesus Cristo. Se no Antigo Testamento era possível expiar cada pecado individualmente através do sacrifício determinado, em Cristo há o sacrifício definitivo para a expiação de não apenas um, mas sim de todos os pecados de todos os indivíduos a quem desejou salvar. A Lei de Moisés é verdadeira ao profetizar a vinda do Messias, sendo Jesus Cristo a própria verdade da Salvação. Jesus não revoga o Antigo Testamento, sendo na verdade Ele mesmo a plenitude da vontade de Deus profetizada.

Antigo e Novo Testamento são igualmente a revelação de Deus para os homens, sendo certo que no AT Deus promete a redenção dos homens e revela Seu plano de salvar a humanidade através do Seu Filho. Em alguns momentos o próprio Jesus aparece aos homens, mas a revelação de fato ocorre com o nascimento o ministério do Filho. O AT revela uma parcela do caráter de Deus, enquanto o próprio Jesus nos permite conhecê-lo por completo.

Nisto consiste o último ponto: Cristo é a plenitude de Deus. João nos declara que ninguém viu a Deus, tendo sido Jesus a revelar quem o Senhor era. É por isso que Ele declara a Felipe que quem vê a Ele, vê ao Pai (João 14:9). Jesus possui a mesma majestade, glória, autoridade e poder que o Pai e o Espírito Santo, sendo consubstancial com os demais membros da Trindade.

E como isso se aplica a nós?

Primeiro, precisamos ter a mesma humildade e discernimento de João Batista e compreender que nossas vidas e ministérios, por mais grandiosos e frutíferos que sejam, não são o mais importante. É preciso proclamar ao Senhor Jesus com todas as nossas forças, fazendo com que Ele cresça e nós sejamos cada vez mais irrelevantes diante da verdade do Evangelho. Se nossas carreiras religiosas e seculares colocam a pessoa de Jesus em segundo plano, elas estão nos conduzindo por caminhos de perdição e engano.

Segundo, não há uma verdade secreta do evangelho escondida para nenhum grupo de pessoas especiais. Todos somos igualmente pecadores, e necessitados do Senhor Jesus. A verdade de Deus não está escondida, mas plenamente revelada na Palavra e na pessoa de Jesus. Nosso Senhor não apenas se deu a conhecer por completo, como também Se deu por completo em nosso benefício, sem ocultar esse fato de ninguém. 

Terceiro, precisamos tomar cuidado com o erro dos fariseus e nos tornarmos legalistas, tomando nossas ações como a nossa própria justiça. A Lei nos mostra que somos pecadores, e se nos atermos simplesmente ao que se deve ou não fazer podemos cair no erro de justificar nossas próprias ações e nos considerarmos justos pelas nossas obras. Além disso, corremos o risco de perder o olhar misericordioso em relação ao próximo, que é igualmente pecador, embora aos nossos olhos nossos pecados são sempre justificáveis. Ao ler a Palavra também precisamos aprender a misericórdia e amor do Senhor Jesus diante da nossa incapacidade de ser perfeitos.

Quarto, se Jesus é a plenitude de Deus não precisamos buscar ao Senhor em rituais, visões e atos proféticos. Se queremos conhecer a vontade de Deus não precisamos buscar novas revelações fora da Palavra: basta aprender com o próprio Jesus Cristo. Deus não se comprometeu a trazer novas revelações, e nem estabeleceu oráculos para atualizar constantemente os homens acerca do que é agradável a Ele. O Senhor nos deixou Sua Palavra, para meditarmos nela e encontrarmos todas as respostas que precisamos.



Daniel e Eclesiastes 11:9-10

 "Jovem, alegre-se em sua juventude! Aproveite cada momento. Faça tudo que desejar; não perca nada! Lembre-se, porém, que Deus lhe pedi...