sábado, 29 de julho de 2023

Jesus e a mulher samaritana - Parte 03 (João 4:27-38)

E nisto vieram os seus discípulos, e maravilharam-se de que estivesse falando com uma mulher; todavia nenhum lhe disse: Que perguntas? ou: Por que falas com ela?

Deixou, pois, a mulher o seu cântaro, e foi à cidade, e disse àqueles homens:

Vinde, vide um homem que me disse tudo quanto tenho feito. Porventura não é este o Cristo?

Saíram, pois, da cidade, e foram ter com ele.

E entretanto os seus discípulos lhe rogaram, dizendo: Rabi, come.

Ele, porém, lhes disse: Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis.

Então os discípulos diziam uns aos outros: Trouxe-lhe, porventura, alguém algo de comer?

Jesus disse-lhes: A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra.

Não dizeis vós que ainda há quatro meses até que venha a ceifa? Eis que eu vos digo: Levantai os vossos olhos, e vede as terras, que já estão brancas para a ceifa.

Lucas 4:27-38




Os discípulos que haviam saído para comprar comida retornaram do mercado e se surpreenderam de encontrar Jesus conversando com uma mulher. A razão pela qual os discípulos ficaram surpresos já foi apresentada nos sermões anteriores, podendo se considerar não apenas o fato de Jesus estar falando publicamente com uma mulher, mas também pelo fato de sendo ele um mestre judeu, estava conversando com uma samaritana. Entretanto, nenhum deles se dispõe à questionar o mestre sobre o que falava com ela ou qualquer coisa do tipo.

Precisamos compreender que os discípulos também eram judeus, sendo razoável compreender que suas relações com os samaritanos também não fossem além das relações comerciais e estritamente necessárias. Por outro lado, ver Cristo dialogando publicamente com uma mulher samaritana ia muito além do que poderia ser considerado normal.

Entretanto, naquele momento nenhum dos discípulos se arrisca a fazer qualquer questionamento, mesmo que as ações de Jesus levantassem curiosidade. Pode ser que naquele momento os discípulos tenham se dado conta que o Senhor sentar-se para conversar com uma mulher samaritana era tão inesperado quanto que ele escolhesse para seus discípulos um pescador e um cobrador de impostos. Tão inusitado quanto confiar o tesouro do evangelho para homens pobres e incultos, ao invés de trazer para seu lado fariseus e doutores da Lei.

Já de início temos a primeira lição: Muitas vezes ao caminhar com Cristo nos deparamos com questões e situações que não somos capazes de compreender. 

Nestas oportunidades, devemos agir da mesma forma que os discípulos, e com extrema humildade aguardar até que o Senhor decida nos revelar a Sua sabedoria e nos iluminar com o entendimento vindo do Espírito Santo. 

Há mesmo na própria Palavra passagens e trechos que num primeiro momento podemos ser incapazes de compreender, ou até mesmo ficar chocados com relatos como o de filhas que embebedaram seu pai para terem filhos, povos inteiros sendo dizimados, profetas sumonando ursas para atacar jovens ou coisas do tipo. 

Neste momento, a barbaridade dos relatos bíblicos, a extensão de fé que é esperada do cristão diante de situações complexas ou mesmo situações que nos expõem à risco de morte podem nos causar indignação. Entretanto, conforme pedimos orientação ao Espírito Santo e maturidade e humildade para nos submetermos à Palavra, percebemos que aquele primeiro choque decorre, na verdade, da nossa própria incapacidade de pensar à luz da Palavra e pela falta de experiência na vida cristã.

Ao mesmo tempo em que os discípulos estão retornando, a mulher sai imediatamente em direção à cidade da qual eles haviam acabado de chegar. A resposta da mulher à afirmação de Jesus de que Ele era o Messias foi a imediata fé, da qual não decorreu qualquer resposta ou pronunciamento apaixonado. A maior demonstração de uma fé genuína foi a vontade imediata de partilhar as boas novas que havia acabado de receber.

Eis a segunda lição: devemos ter o mesmo zelo evangelístico que a mulher samaritana. 

Importante ressaltar que a única coisa que aquela mulher ouviu da parte de Jesus é que Ele era o Messias. Jesus não havia ensinado nada como fizera no sermão da montanha, não explicou para aquela mulher o Pentateuco que ela possuía, não abordou as grandes profecias do Antigo Testamento acerca da Sua vinda. Ele havia apenas declarado para aquela mulher quem Ele era, e para ela, que havia acabado de testemunhar o Seu poder, foi o suficiente.

Aquela mulher então parte em direção à cidade, e convida aos demais a testemunhar da presença santa de Jesus Cristo. Ela não se presta a tentar convencer qualquer homem acerca de quem Cristo era, e os convida para desfrutar da presença do Mestre e desenvolver um relacionamento pessoal com Ele, dando o testemunho de tudo que Jesus havia revelado sobre a vida dela, demonstrando Seu próprio poder. 

Aquela mulher não tinha qualquer instrução para dar, e para piorar, era detentora de um passado sórdido, e provavelmente conhecido por toda a cidade. Não era só mulher, o que por si só já descredenciaria a sua palavra; mas também era adúltera, o que fazia dela uma pessoa socialmente reprovável, e até mesmo passível de apedrejamento.

As nossas limitações podem nos impedir de entrar em debates teológicos e nos fazer perceber que somos incapazes de convencer alguém acerca da existência de Deus e da divindade de Jesus Cristo. E de fato, nós somos incapazes. As pessoas podem zombar de nós por nosso passado e história, e até mesmo tripudiar tudo aquilo que nós falamos simplesmente por ter sido dito por nós mesmos. Da mesma forma que a mulher samaritana poderia ser desconsiderada por ser uma mulher adúltera, podemos ser desconsiderados por sermos ex-traficantes, ex-adúlteros, devassos, maliciosos ou criminosos. Nem por isso podemos nos acovardar e deixar de pregar a Palavra. Se nossa própria regeneração não é suficiente para apontar Jesus para uma pessoa, façamos como a mulher samaritana, e convidemos as pessoas a elas mesmas terem contato com Jesus.

Aquelas pessoas então vão em direção à Jesus, diante do anúncio da mulher samaritana de que Ele era o Messias esperado. Neste meio tempo, os discípulos solicitam a Jesus que pare o que estava fazendo para se alimentar. Até aquele momento Jesus não havia se alimentado, e possivelmente não havia matado a Sua sede, tendo em vista que a mulher samaritana deixou seu cântaro e correu para cidade. 

A resposta de Jesus foi que Ele tinha comida para se alimentar naquele momento, mas os discípulos não conheciam. E de fato os discípulos não compreendiam o que Jesus falavam, tendo em vista que ficaram se questionando se alguém havia levado comida para eles enquanto estiveram fora, e por isso não era mais necessário comer. Nesse momento, Jesus os responde que a comida dele era fazer a vontade do Pai e realizar a obra à qual seu ministério estava proposta.

Jesus está  nos dando a terceira lição: Fazer a vontade de Deus é uma necessidade maior do que as nossas próprias necessidades pessoais. 

Jesus não está impondo aos seus discípulos que fizessem rigorosos jejuns de comida ou bebida, nem estava estabelecendo que deveriam ficar sem comer. Jesus está mostrando para seus discípulos que a necessidade dos samaritanos era espiritual e urgente, enquanto as dele eram secundárias. Como humano, Jesus poderia ficar dias sem comer ou beber, como outrora fizera no deserto enquanto fora tentado por Satanás, sem com isso morrer. Os samaritanos, por outro lado, estavam mortos em delitos e pecados, e precisavam urgentemente nascer de novo. Os discípulos queriam que Jesus deixasse aquelas pessoas esperando enquanto ele comia, mas para Jesus, alimentar espiritualmente as  pessoas era mais importante. 

Precisamos ter esse senso de urgência que coloca a missão do cristão acima das suas volições e anseios. Na prática muitas vezes vemos o chamado cristão para o evangelismo e pregação ser colocado de lado em decorrência de necessidades aparentemente mais urgentes como trabalhar, concluir uma carreira acadêmica, gerir nossos relacionamentos pessoais, ter momentos de lazer, etc.

É para nos fazer refletir o que é mais importante quando estamos a caminho de um passeio no fim de semana e recebemos uma ligação de uma pessoa precisando da nossa companhia; para refletir quando separamos dinheiro para pedir uma pizza e tomamos conhecimento das necessidades de um missionário; ou aquele momento em que estamos atrasados ou apressados para qualquer coisa e uma pessoa em situação de rua pede nossa atenção. Você para, olha a pessoa nos olhos enquanto ela fala, mesmo sabendo que muitas vezes ela só quer pedir dinheiro? Ou então você a interrompe com rispidez ou joga dinheiro imediatamente em suas mãos, como se fosse essa a única necessidade daquela pessoa?

Certa vez presenciei durante um culto a entrada de um morador de rua na igreja, e durante a ministração do louvor um dos cantores que estava no púlpito pediu para demonstrarmos nossa alegria e comunhão através de cumprimentos e abraços. Entristeci-me ao constatar que mesmo as pessoas na mesma fileira de cadeiras daquele senhor não se dispuseram sequer a apertar a mão daquele homem. 

Via-se que não era "só mais um bêbado", pois o homem estava lúcido, não cheirava a álcool, mas apresentava mal cheiro intenso, e percebia-se não só pelo odor como aspecto que ele de fato habitava nas ruas. Ele estava na última fileira da igreja, eu na terceira, e me desloquei até ele, apertei sua mão, olhei nos seus olhos e perguntei seu nome. Ele, com extrema alegria me disse seu nome... Gustavo. Então ele agradeceu por eu ter perguntado o nome dele, sorriu, e o culto seguiu normalmente.

E se minhas roupas tivessem sujado? - Em casa eu as poderia lavar.

Ele estava sujo, poderia me contaminar com alguma bactéria ou vírus. - Eu poderia discretamente lavar as mãos em algum momento, sem levá-las à boca ou olhos.

Eu poderia ficar fedendo? -  Dificilmente, mas caso ocorresse, seria por muito pouco tempo comparado àquele homem.

Mas aquele culto poderia ser a última oportunidade daquele homem experimentar o calor da comunhão do corpo de Cristo. Poderia ser a oportunidade dele sair dali quebrantado pela Palavra e pelo acolhimento, ao invés de sair decepcionado, nos acusando de tratá-lo como se fosse menos humano que qualquer um. A necessidade daquele homem era maior do que qualquer coisa que nós pudéssemos alegar para nos mantermos afastados dele naquele momento.

Isso se confirma pela afirmação de Jesus, ao comparar o que estava ocorrendo com a ceifa que estava para acontecer. O tempo de ceifar as colheitas estava previsto para ocorrer daqui há quatro meses, e Jesus se aproveita disso para chamar a atenção dos seus discípulos.

Neste momento ele nos traz o quarto ensinamento: O tempo da colheita é agora.

Enquanto eles esperavam quatro meses pela colheita, ela já estava pronta para ser realizada. Jesus estava dizendo que a sua fome era de realizar a vontade do Pai, a semente que havia sido lançada no coração daqueles samaritanos já estava pronta para ser colhida naquele momento. Aquela era a hora de pregar o Reino de Deus e promover os batismos. 

A mensagem da mulher samaritana não demandaria meses para surtir efeitos, através do ensino da Palavra programático, de enviar um discípulo para passar meses com os samaritanos... O momento era aquele. Aliás, a semente em si já fora plantada desde o Pentateuco que os samaritanos consideravam como texto bíblico. A chegada de Jesus em Sicar era o momento da colheita dos frutos decorrente da Lei que previa a vinda do Messias. Quando Jesus declara que Ele era o Messias, estava realizando a colheita decorrente da semente plantada na Palavra. 

E o que ceifa recebe galardão, e ajunta fruto para a vida eterna; para que, assim o que semeia como o que ceifa, ambos se regozijem.

Porque nisto é verdadeiro o ditado, que um é o que semeia, e outro o que ceifa.

Eu vou enviei a ceifar onde vós não trabalhastes; outros trabalharam, e vós entrastes no seu trabalho.

Por fim, Jesus nos dá o quinto ensinamento: a função dos seus discípulos deve ser pregar o Reino, vejam o resultado ou não.

Quando Cristo declara que seus discípulos ceifam o que não plantaram, Ele está declarando a verdade do Evangelho pela qual compete a cada cristão pregar Jesus Cristo, e ter isso como sua única preocupação. Os discípulos estavam colhendo os frutos da pregação da Lei e dos profetas, e nós, hoje, colhemos os frutos que muitas vezes não fomos os responsáveis por plantar. Eles continuaram o trabalho que não haviam começado, e nós também fazemos isso.

Jesus também está falando sobre galardão que é ajuntado para vida eterna, deixando claro que tanto aquele que semeia quanto aquele que colhe se regozijam  nos frutos para vida eterna. O galardão portanto é apresentado como um benefício dado por Deus aos homens por sua graciosa vontade de ser abençoador e galardoador daqueles a quem ama. Não há uma distinção entre quem planta e quem  colhe, e no fim das contas, todos devemos administrar nossos talentos com dedicação e alegria.





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