terça-feira, 30 de outubro de 2018

Alguns pontos sobre as eleições

1 - Tenho acompanhado muitos conflitos e questionamentos acerca do resultado das eleições para presidência no Brasil. Filhos brigando com pais, amigos rompendo laços, pessoas que até então eu considerava sensatas perdendo o decoro e coerência.

2 - Diante do estado caótico do nosso país, no tocante aos escândalos de corrupção que geraram rombos bilionários nos cofres públicos, o impeachment da presidente Dilma Rousseff e prisão de Luíz Inácio Lula da Silva, parte da população brasileira entrou em estado de repulsa ao Partido dos Trabalhadores (PT). Este sentimento é um dos pilares dos conflitos que iniciaram no período de eleições.

3 - A fim de satisfazer os anseios desta parcela da população, Jair Messias Bolsonaro inicia a sua campanha em direção a presidência do Brasil. Entretanto, visto que o referido candidato é responsável por diversas frases ofensivas, que, admitamos, inflamou um discurso de ódio num grupo de brasileiros que já estavam com raiva. Parcela da população passa a adotar um discurso ríspido e com certos tons de intolerância, enquanto a outra parcela o acusa de ser homofóbico, racista, facista, estrategista, massagista e tantos outros"istas" possíveis. Este fator é o segundo pilar dos conflitos eleitorais de 2018.

4 - Em meio a fake news, brigas e acusações de que o candidato Bolsonaro pretende instaurar a ditadura militar, enquanto os seus eleitores acusam Haddad de querer transformar o Brasil na nova Venezuela, ou mesmo uma ditadura do proletariado; civis começam a trocar ofensas pesadas e mesmo descabidas. O estudante que teme uma ditadura e cessação de direitos humanos é taxado de comunista e libertino; o autônomo e pequeno empresário que deseja uma abertura de mercado maior com menores impostos é taxado de opressor e burguês explorador. Este é o terceiro pilar dos conflitos. Os dois candidatos vão para o segundo turno, com a vitória de Jair Messias Bolsonaro.

5 - No meio desta sociedade caótica, divididos nos dois grupos estão os cristãos. A falta de cosmovisão cristã por parte da igreja como um todo levou a ilusão de que o mundo é preto e branco, de forma que adotar pontos de vista de um dos dois lados da disputa é automaticamente adotar a pauta inteira. Pior ainda, os cristãos de cada grupo adotaram a postura de que os seus opositores políticos afastaram-se da sã doutrina e venderam sua alma para Baal. Este é o motivo do presente texto, razão pela qual declaro que:

6 - Em primeiro lugar, dizer que quem votou em Bolsonaro ou Haddad não pode ser cristão é tolice. Cristão é quem imita Cristo e crê nEle, e não quem optou por um ou outro candidato. Não há outro requisito para ser filho de Deus que não seja a fé em Cristo. A maior acusação que poderia ser feita com certa coerência seria de que o eleitor do candidato A ou B peca por desconhecimento da Palavra ao adotar a pauta de um ou do outro.

7 - Em segundo lugar, nenhum dos candidatos tem uma pauta 100% cristã, até porque eles presidirão o país como um todo, e não apenas os cristãos. Coube a cada cristão analisar as pautas, propostas e buscar aquele candidato que lhe passou mais segurança nas propostas de governo. Ademais, naquilo em que Deus e Sua Palavra é ofendido, o cristão tem meios de intervenção direta na política.

8 - Ao cristão cabe a tarefa de pregar o evangelho de Cristo para todas as pessoas, e não de apontar quem de fato são os eleitos. Lembre-se: a onisciência é um atributo de Deus!

9 - Nenhum líder religioso tem autoridade para impor sua vontade política para o rebanho sob seu pastoreio. Basta uma leitura de Romanos 13 para entender que todas as pessoas devem respeitar as autoridades civis. A mesma autoridade civil brasileira que instituiu que o voto é pessoal, direto e secreto, o que deslegitimiza qualquer intervenção no sufrágio alheio.

10 - O púlpito não deve ser utilizado com qualquer outra finalidade que não seja a proclamação do evangelho. Promoção pessoal ou de grupos e partidos, cuja finalidade é beneficiar um determinado grupo devem ser desestimulada, e o líder eclesiástico responsável deve ser repreendido e disciplinado.

11 - Boa parte dos conflitos foi gerado por falta de conhecimento da Palavra, que ensejou a aparente contradição entre as pautas e eleitores. Ratifico: votar em um candidato não determina se você é cristão ou não.

12 - Devemos compreender, por exemplo, os que votaram no Bolsonaro em busca do direito de autodefesa, baseando-se em Êxodo 22:2; mas também compreender os que repudiam tal posição sob a alegação de que devemos ser mansos e pacíficos, tutelando sua posição em Mateus 5:38-48. Entender os que escolheram Bolsonaro pensando na livre iniciativa com base em Salmo 128:2; mas também entender os que votaram em Haddad em busca de uma justiça generosa que contemple a moral de Deus e dever social de cuidar dos hipossuficientes, usando para tal, passagens como Tiago 1:27. Interessante é que nenhuma das passagens se contradizem!

13 - Desta forma, as eleições de 2018 não dividiram a igreja por separar o joio do trigo, e sim por deixar evidente para toda a sociedade brasileira que não sabemos aplicar a Palavra que dizemos defender. A igreja brasileira está dividida por falta de conhecimento, e principalmente de amor.

14 - Neste ponto, vale informar que nenhum líder religioso tem prerrogativa para declarar que todos os outros não são cristãos, simplesmente porque não adotam a sua pauta e cosmovisão. Ninguém deve se apresentar como a única luz que não ficou sob o candeeiro, nem mesmo referir-se aos cristãos que votaram no candidato ao qual se opõem como "ossos secos".

15 - Temos a grande responsabilidade de consertar esses erros. Acho que não é preciso dizer muito sobre esse ponto. 

16 - Quanto ao resultado, rogo que tenhamos em mente que, seja lá qual fosse o resultado, é o Senhor quem estabelece reinos e governos, seja pra exaltação ou juízo do povo. Isto deve ser para nós razão de descanso, pois sabemos que o nosso Pai está no controle, e que, mesmo se um mal governo vigorar, a justiça do Senhor para a vida dos responsáveis será consumada ao tempo certo.

17 - No tocante aos resultados, devemos ponderar:

18 - Primeiro, que diferente do que alguns vêm dizendo, não houve violação à democracia, visto que o presidente foi eleito por voto direto. Os 43 milhões que votaram contra não tem legitimidade para se opor ao resultado proveniente da escolha dos outros mais de 50 milhões de eleitores.

19 - Entretanto, esses números nos demonstram que a dita "minoria" é uma parcela considerável da nossa nação. Nosso presidente tem a responsabilidade de governar para eles também. Diante do resultado, o Brasil deve derrubar essa barreira criada entre a dita direita e esquerda, e trabalhar juntos para restaurar o país. Até porque esse espectro político é bem confuso no nosso país.

20 - Devemos ser sensíveis para entender a oposição. Por detrás de cada "comunista" há um trabalhador que teme seus direitos serem restringidos; por detrás da "facista" há uma senhora que foi vítima do crime sem ter sido amparada pelo Estado. Lutamos contra um inimigo invisível que projetamos no outro. Lembre-se que o ditador que você está combatendo é o seu filho, seu pai, vizinho, avó, pastor. Pessoas com as quais você sempre conviveu e que agora decidiu atacar.

21 - Aos que estão torcendo para que o presidente faça um governo ruim, é necessário uma auto-avaliação, e alguns cultos sem ceia. Devemos orar por aqueles que nos governam, para que façam o melhor, e não desejar que piorem algo que já está ruim, porque seu ego é maior que sua vontade de ver o bem de todos.

sábado, 20 de outubro de 2018

Salmo 1:5 - Os ímpios e a congregação dos justos


"Por isso, os perversos não prevalecerão no juízo, nem os pecadores na congregação dos justos."
(Salmo 1:5)

 O ímpio, como visto anteriormente, é comparado com a palha lançada ao vento. Desorientado e inútil, seco e arrastado por todos os ventos, sem finalidade ou capacidade de fincar-se ao solo e gerar vida.

E por esta razão é dito que ele não prevalecerá no juízo ou na congregação dos justos. Ora, se uma árvore que não produz frutos só serve como lenha a ser queimada, que diremos então da palha do trigo? Não prevalecerão, pois serão lançados ao fogo, onde a única finalidade da sua existência será ser consumidos infinitamente Não importa o que façam agora, ou o quanto clamem no futuro: sua sentença já está decretada, ,, e suas obras não prevalecerão diante do Senhor.

 1 - Diante de Deus não haverá pecadores

a) O pecado é infinitamente condenável, tratando-se de uma ofensa contra O Deus infinito.

b) O que nos impede de ver isso é nossa própria natureza pecaminosa e limitada, que não reconhece a proporcionalidade da condenação do ofensor ante o ofendido.

2 - O ímpio não terá outro destino que não seja o afastamento eterno do amor de Deus

a) Ele pode passar toda a vida praticando o bem ou vivendo em uma igreja. Ao final, ele não perseverará.

b) Não há nada que o homem possa fazer que o torne mais Santo ou digno da vida eterna de gozo

c) Porque o céu não é um prêmio de comportamento. É a reunião dos filhos com o Pai. Homens que o recusam diariamente não possuem razões para querer desfrutar o Paraíso.

3 - Analisando por outra perspectiva, podemos ter certeza da nossa salvação, pois se não há nada que justifique o ímpio para ser salvo, igualmente não há nada que retire do justo a vida eterna com Deus.

a) O justo é tão indigno do céu quanto o ímpio / Quem garante a salvação é Deus, por Sua própria natureza e pessoa.

b) Não há mérito em ser salvo. Nada conduz o homem a Deus a não ser a misericordiosa disposição de Deus em salvá-lo.

c) Por essa razão podemos descansar no Senhor , sabendo que Aquele que começou a obra, há de completá-la em nós.  

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

STCN - Resenha do artigo "Espiritualidade: Cristã ou Líquida?"

Mais um trabalho entregue no seminário! Dentro da grade curricular, a Capelania se tornou disciplina obrigatória, visto que durante os próximos três anos há possibilidade de eu ficar afastado da minha igreja local aumenta consideravelmente, pois em breve estarei fazendo estágio em outra igreja (se bem que os meus pastores são professores no seminário). Caberá ao Deão, na medida do possível, acompanhar a mim e os demais seminaristas durante os próximos semestres, o que torna crucial nossa participação nas atividades (e a tendência de todo estudante é só querer fazer o que for obrigatório).


A UIECB deu um grande passo em prol do crescimento teológico das igrejas e seminários da denominação: em agosto de 2018 o Departamento de Educação Teológica da União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil lançou a primeira edição da Revista Teológica, com 7 artigos produzidos por pastores da nossa denominação.

Cada aluno do seminário recebeu uma revista, e foi incumbido de escolher dois artigos sobre os quais deveria produzir resenhas. Escolhi os artigos 2 e 7 da revista. O primeiro traz o tema "Espiritualidade: Cristã ou Líquida?", escrito pelo Reverendo Márcio Leal, o qual, após a leitura, produzi a resenha abaixo:



ESPIRITUALIDADE: CRISTÃ OU LÍQUIDA

Leal, Márcio de Carvalho. Revista Teológica: Departamento de Educação Teológica da União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil. UIECB-DET. 1. Ed. Rio de Janeiro: Contextualizar, 2018.

O artigo escrito pelo Reverendo Márcio Leal aborda a espiritualidade do ser humano, fazendo um paralelo entre princípios bíblicos e o conceito de espiritualidade líquida, demonstrando, portanto, os efeitos da modernidade na vida do cristão. Cumpre salientar que o conceito de modernidade é espelhado em Zygmunt Bauman, para referir-se à pós-modernidade, portanto, o artigo aborda a espiritualidade do homem no período pós-moderno.

O autor inicia analisando o conceito de espiritualidade no curso da história da igreja, tanto do ponto de vista católico quanto o protestante, bem como a decomposição do termo, que deixa de caracterizar uma atividade proveniente da graça do Espírito Santo para caracterizar aquilo que não é material, dando origem a um dualismo através do qual infere-se que para viver espiritualmente é necessário distanciar-se do mundo.

Neste ponto, o autor afirma que segundo o Novo Testamento, o ser humano espiritual “é animado, transformado e potencializado pelo Espírito de Deus através de uma comunicação caritativa e oblativa”, o que altera o paradigma vital da vida do cristão, dando origem à uma nova prática a partir dos ensinos do Senhor Jesus Cristo. Ao falar da comunicação caritativa e oblativa, o autor refere-se ao exemplo de Cristo de caridade com todos os homens e entrega própria ao Pai, como oferta agradável.

A fim de trazer uma definição de espiritualidade cristã, o autor analisa o que é considerado um ser humano “espiritual”, usando o termo grego pneumatikós, que está presente em 1 Coríntios 3:1 e diz respeito à pertencer, ser motivado ou controlado pelo Espírito Santo. Essa operação do Espírito no homem, de acordo com o autor, se dá mediante a lei do Espírito, que dá a vida em Jesus Cristo, nos termos de Romanos 8:2. Essa mudança da lei do pecado para a lei de Deus no homem acarreta uma transformação integral, através da qual a essência do homem é mudada, e desta forma, a sua existência material também. A definição dada pelo autor é a de que “podemos definir a espiritualidade cristã como aquela que se refere à busca por uma experiência cristã autêntica e satisfatória, baseada na fé, nos valores e princípios cristãos” com impulso inicial dado pelo Espírito Santo e tendo como paradigma o Senhor Jesus Cristo.

Partindo desta premissa, o padrão de espiritualidade a ser vivido pelo cristão é a busca incessante de ser um imitador de Cristo. Desta forma, o autor constrói sua tese de que a espiritualidade cristã deve tomar forma concreta na história, e não ser apenas uma experiência interior ou de mera reflexão, trazendo transformações não apenas morais, como também sociais. Logo, a espiritualidade nestes termos diz respeito a mudança do ser pelo Espírito, para um agente de mudanças e transformações no mundo a sua volta. A doutrina encontra amparo em Bonhoeffer, que, de acordo com o autor, afirma que a espiritualidade ensinada por Cristo englobava não apenas a vida de oração constante, mas também a assistência social aos famintos, a cura dos enfermos e expulsão de demônios. A vida de Cristo é o exemplo perfeito de amor ao próximo.

Cabe uma ressalva à escolha do texto bíblico utilizado para afirmar que devemos assumir uma vida de seguimento a Cristo para ter uma espiritualidade genuinamente cristã. O versículo escolhido pelo autor foi Gálatas 2:19, e diz respeito à fala de Paulo acerca da justificação pela fé em Cristo, em um momento de oposição à postura possivelmente judaizante do apóstolo Pedro perante aqueles que vieram de Tiago, ao levantar-se da mesa dos gentios, abrindo margem para a interpretação dos demais de que a justificação implicava na observância da Lei. Paulo, portanto, afirma que a Lei aponta para Cristo, o qual fora crucificado; e que tendo seus pecados levados na cruz sobre Cristo, está morto para a prática da Lei, visto que não mais imputa a sua justiça por ela, mas reveste-se da graça e justiça de Cristo na cruz.

Também merece ressalva a tradução transcrita para o versículo que, conforme nota de rodapé da página 21, diz respeito à Bíblia em Linguagem Contemporânea. Enquanto o mesmo versículo na tradução de João Ferreira de Almeida traz a ideia de ter morrido na cruz com Cristo, ou seja, a morte do velho homem com o nascimento do novo homem, a tradução contemporânea traz a ideia de identificação total, o que não exatamente infere um novo nascimento, e pode dizer respeito simplesmente a identificar-se ideologicamente, por exemplo. Poder-se-ia criar um paralelo entre “estar crucificado com Cristo” e “identificar-se totalmente com Ele” semelhante ao encontrado em João 21:15-23 (agapao/phileo). A primeira parte do versículo também merece cuidado, visto que a tradução apresentada traz uma afirmação de Paulo quanto a não obter êxito em ter tentado agradar a Deus pela observância da lei quando não é possível inferir tal informação do versículo, visto que o objetivo do apóstolo é afirmar que morreu para a lei por descobrir a justificação em Cristo.

Após formular o conceito de espiritualidade cristã que norteia todo o artigo, o autor passa a abordar o conceito de espiritualidade líquida inerente à sociedade contemporânea observada por Zygmunt Bauman. Tal espiritualidade tem como marca o antropocentrismo, hedonismo, relativismo e relações com um deus chamado consumo.

Trata-se de uma análise brilhante acerca do quadro de boa parte das igrejas em funcionamento, com destaque àquelas de doutrina neopentecostal. Igrejas contaminadas pelo mundo, onde a cruz se tornou um mero acessório para um misticismo cujo único objetivo é satisfazer o desejo do homem de uma experiência estática e/ou sensitiva. Igrejas que reforçam a vontade do homem de sentir-se especial e diferente.

O autor aponta que esta espiritualidade líquida faz o homem perder o foco de que o Espírito Santo nos comunica Cristo, Sua relação trinitária e Sua doação e comunhão. Embora haja controvérsias em afirmar que somos a mão de Deus na história, sendo mais correto afirmar que Deus age apesar de nós; o autor é contumaz ao demonstrar que assim como o nosso Deus ama e vive em comunhão, nós somos chamados a amar ao próximo e viver em comunhão uns com os outros, cuidar do pobre, da viúva e do estrangeiro, ser sal e luz do mundo. Neste ponto, não basta não ser violento. O autor defende a necessidade de solidarizar-se com o outro a ponto de buscar meios para que os demais também não sejam.

Portanto, o autor vincula espiritualidade à busca por justiça social. Esta é de fato uma marca da obra de Deus no homem, visto que desde a Velha Aliança o cuidado aos necessitados fazia parte da lei de Deus, fosse pelo mandamento de amar ao próximo como a si mesmo, ou nas prescrições de cuidados com as viúvas, órfãos e estrangeiros, os hipossuficientes e excluídos da sociedade.

Conclui-se que a espiritualidade cristã traz consigo o amor ao próximo e a transformação de vida que leva o homem a tirar o foco de si e colocá-lo em Deus. Ao fazê-lo, o amor de Cristo nos constrange e nos estimula a amar ao próximo, transformando-se em agente transformador do mundo a nossa volta. Portanto, espiritualidade caminha junto com justiça social, pois desperta no filho de Deus a piedade e compaixão. Embora a crítica do autor à espiritualidade líquida seja focada no comprometimento do amor ao próximo, esta é antes de qualquer coisa um comprometimento da relação do cristão com Deus, visto que mesmo que por ignorância o homem passa a adorar a si mesmo.

Pedro Silva Drumond é acadêmico do primeiro período do Curso de Teologia do Seminário Teológico Congregacional de Niterói.

domingo, 7 de outubro de 2018

75 anos... A igreja que cresce!


Noite de batismo e recepção de novos membros. Vem a minha mente três passagens da Palavra de Deus: Atos 2:47; 9:41; 16:5. A igreja louvava a Deus por tudo, ela tinha coragem para viver o evangelho, e ela era edificada na fé. Resultado de tudo isso? Ela crescia dia após dia.

Irmãos, quando a igreja é saudável, cresce. Mas crescimento não são apenas números. Antes de tudo,  a igreja  cresce em conhecimento da Palavra, fé, comunhão, disciplina, amor e edificação dos que já estão presentes. E neste contexto ela é uma igreja pronta para crescer numericamente.

A Igreja Evangélica Congregacional de Niterói faz seus 75 anos neste mês, e tem o privilégio de crescer em Cristo, e em Cristo crescer numericamente. Ao todo 23 novos irmãos passarão a fazer parte do rol de membros da nossa igreja! Lendo as passagens citadas e seu contexto, fica claro que tal crescimento não pode ter outra origem que não seja a ação de Deus em Sua igreja.

Para os que já estão conosco, foi um ano de muito crescimento espiritual. Tempo de reconciliações, de crescimento teológico e de maior comunhão e participação na igreja. Crescemos uns com os outros para estarmos preparados para receber os filhos de Deus que ainda estavam por vir neste ano. E cá estamos nós!

Porque o crescimento da igreja deve nos alegrar? Mais gente significa menos trabalho? Pelo contrário! Como sacerdotes uns dos outros, o nosso trabalho é ainda maior! São mais irmãos que devemos edificar, cuidar, orar junto, aprender a conviver, ensinar, perdoar diante da ofensa, e tudo mais quanto é possível ocorrer num ajuntamento de pessoas. Então por que estamos alegres?

Lógica proposicional simples: um irmão a mais na igreja é um pecador a menos no mundo. Quando a igreja cresce, o mundo diminui. Quando a igreja cresce é sinal que alguém que era cego passou a ver a verdade em Cristo!

Que a nossa alegria nesta noite seja a certeza que Cristo é conosco, a ponto de permitir que pessoas que creram nEle se juntem a nós dominicalmente em adoração! Que a nossa alegria seja ouvir estas ovelhas escutarem a voz do seu Pastor! Aos que estão sendo recepcionados, que a nossa alegria seja saber que, podendo enviar para qualquer outra igreja, Cristo mandou tais irmãos para nós, a fim de que juntos continuemos a caminhada pelo caminho estreito.

Orem por nossa igreja. Que ela continue a crescer até que Ele venha! Novas metas, novos desafios, um único objetivo: a glória de Deus!


sábado, 6 de outubro de 2018

Salmos 1:4 - O homem de palha

"Não são assim os ímpios; mas são como a moinha que o vento espalha."
(Salmo 1:4)



Após comparar os justos a uma árvore junto a corrente de águas, o salmista volta a referir-se ao ímpio, comparando-o com a palha que é lançada para longe. O que esta sentença tem a nos ensinar?


A palha no período do salmista era o cúmulo da inutilidade e falta de aproveitamento. Não tinha raiz, peso ou utilidade. Quando era joeirada, o vento lançava-a para longe, e apenas os grãos ficavam.

É isso: o ímpio é inútil. 

Qual é a utilidade do homem que não crê em Deus no fim das contas? Qual a razão da sua existência? Não havendo Deus, somos um grande acidente cósmico, fruto da aleatoriedade. Nascemos e morremos sem objetivos, e na tentativa vã de não enlouquecer em nossa insignificância buscamos formas de nos dar um sentido. Em um universo com bilhões de anos de existência, buscamos deixar nossa assinatura na eternidade. 

Como a palha, o ímpio é levado não apenas por ventos de doutrinas, ele é simplesmente levado. Vaga pelo mundo sem um objetivo definitivo, buscando sentido, uma forma de ser mais do que nada, para não morrer da mesma forma que nasceu: sem qualquer utilidade. Busca dar peso a sua existência através das suas obras, busca perpetuar-se por suas ideias e exemplos. O homem não aceita a insustentável leveza de ser tão breve e incompleto sem Deus; busca viver, ainda que como ideia. Shakespeare dedicou diversos sonetos a falar da beleza da mulher amada, lamentando que ela envelheceria com as estações. Cria, portanto, o Soneto XVIII com o objetivo de eternizá-la. O tempo levaria beleza e vida, mas em sua concepção, ela seria eterna, pois transporia as gerações junto com o soneto.

A verdade é que a vida do homem só faz sentido a partir do momento de que ele reconhece a existência de Deus. Ele deixa de uma criatura natimorta e passa a ser filho de Deus. Ele descobre que sua existência, antes sem sentido, na verdade tem como fundamento a glória de Deus e seu incomparável amor, visto que diante da ofensa do pecado, manifestou a Sua misericórdia! Descobre que nasceu para servir ao Senhor, cuidando pessoalmente da criação, governando sobre todas as criaturas.

Deus é o fundamento da existência, e, não O encontrando, o ímpio ergue a si mesmo ou ídolos na busca de completar o seu vazio existencial; sua falta de Jesus. Ele faz de si o seu próprio Deus; de suas obras mandamentos. Ele busca em homens a sua própria salvação. Busca ídolos segundo seu coração, que é repleto de misticismo, ao invés de espiritualidade. Ele procura auxílio de coachs para suas aflições e falta de fé, como se tentasse suturar uma ferida com band-aids; quando na verdade ele só precisaria olhar pra Jesus Cristo!

Só o homem com Cristo alcança o que o ímpio apenas deseja: gozar a vida, e ao fazê-lo, ter um sentido para viver e existir. 


STCN - Resenha do livro: Recomendações aos jovens teólogos e pastores

Thielicke, Helmut. Recomendações aos Jovens Teólogos e Pastores. Vida Nova. 2014.





A obra escrita por Helmut Thielicke aborda, em suma, os perigos para a alma do jovem estudante de Teologia. Tais perigos não se restringem aos riscos externos, e por vezes tem sua gênese no próprio coração e mente do aluno. A obra objeto de estudo possui grande valor não apenas para aqueles que estão iniciando seus estudos, a fim de que estejam cientes dos riscos aos quais serão expostos, de forma que possam trabalhar medidas para impedi-los ou remediá-los; como também para os pastores responsáveis por esses jovens, a fim de que estejam prontos para tomar medidas em prol da saúde espiritual do jovem teólogo.

O primeiro problema a ser encarado pelo autor é apresentado como a ansiedade do cristão comum quanto ao estudo da Teologia, de forma que diversos jovens que despertam o seu interesse pelo estudo teológico são alertados pelos membros da igreja acerca da possibilidade de corromper-se. Tal cetismo em relação ao estudo acadêmico da Teologia tem como fundamento a preocupação com a saúde espiritual do aluno. O autor aponta dois fundamentos basilares desse cetismo em relação a Teologia: Experiência e Princípios. Ambos os argumentos são trabalhados de forma clara e concisa no decorrer do livro.

No que diz respeito as experiências o autor aborda o retorno do jovem teólogo para igreja, que no decorrer dos seus estudos começa a perder a piedade e vigor espiritual em detrimento de conceitos e ideias abstratas. Neste ponto o autor é extremamente eficaz em demonstrar que os desvios por parte do estudante por vezes são tão indistinguíveis e traiçoeiros quanto o pecado pode ser. Tomando a forma da devoção apaixonada pelo pensamento teológico que muda o pensar e falar do estudante, o esfriamento espiritual encontra espaço na lacuna entre todo o conhecimento adquirido na cadeira da academia e a efetiva experiência de vida do jovem teólogo. Conceitos teológicos que moldam o pensamento hoje são frutos não apenas do pensamento, como também do esforço e experiência espiritual daqueles que os desenvolveram. Thielicke denomina este problema de “Experiência Conceitual”, que nada mais é do que o conhecimento desprovido da experiência de vida que o fundamenta, originando os problemas de conduta e intelectualidade exacerbada. A solução apontada pelo autor é silenciar o jovem estudante, impedindo-o de lecionar ou pregar, até que intelecto e experiência estejam caminhando juntos.

A lacuna intelecto/experiência é apresentada na figura de uma espécie de “puberdade teológica”, comparando a fase inicial dos estudos teológicos com a fase de mudança hormonal e fisiológica do corpo humano. Outro ponto interessante abordado pelo autor é que esse fervor por intelectualidade, quando desprovido da experiência de vida piedosa tem como um desdobramento o crescimento da vaidade por conceitos teológicos que leva o estudante a afastar-se dos demais cristãos considerados leigos. Esse orgulho intelectual tem como principal motivo a natureza pecaminosa do homem, pela qual amor e verdade tendem a caminhar separados. De um lado o conhecimento seduz através do sentimento de posse e poder pelo saber, levando o jovem estudante ao sentimento de superioridades, o que é chamado de Psicologia do Possuidor; por outro, o amor é apresentado como o oposto do conhecimento, na medida em que o conhecimento é individual e tende à vanglória, enquanto o amor é altruísta e humilha a si em favor do outro.

No que diz respeito aos princípios, o autor apresenta os pressupostos do cristão comum como outro ponto de cetismo em relação à Teologia. O foco é dado à herança teológica da Reforma Protestante, na figura do “Sola Fide” e “Sola Scriptura”, uma vez que a igreja no geral questiona a necessidade de conhecimentos adicionais para sustentar a fé, diante da exclusividade da mesma para salvação e da autoridade das Escrituras como regra de fé e prática. É evidente que o âmago da discussão diz respeito à fé salvífica, de forma que o autor salienta que é incondicional, desvinculada do resultado de pesquisas históricas, afirmando que não é o esforço teológico que chancela a fé do teólogo. Longe da motivação, o esforço teológico é um ato de fé, pressupõe que a mesma já exista e motiva o pensar e agir do estudante. Desta forma, o estudo teológico está inserido no conceito de “Soli Deo Gloria”, como ato de fé para o teólogo glorificar ao Senhor com todo o seu entendimento.

Segundo o autor, uma vez que a Dogmática é comparável à uma arte difícil e elevada, em razão de ter como objeto de estudo a revelação de Deus ao homem, é necessário ter cuidado com a metodologia de estudo. Teologia deve ser feita na segunda pessoa, colocando a revelação como forma relacional do homem com o Senhor. A mudança de foco ocorre geralmente quando o jovem teólogo troca a leitura devocional pelo labor exegético do texto. É necessário, portanto, que a teologia seja feita em oração, reconhecendo que mais do que registro histórico, a Palavra é Deus dirigindo-se a quem estuda. Nesse ponto, pode-se afirmar que o objeto de estudo da Dogmática não pode ser considerado apenas do ponto de vista acadêmico e científico, uma vez que não possui todos os seus pressupostos interpretativos e pedagógicos. Um bom exemplo está no conceito de Morte do Autor, de Barthes. A necessidade da Teologia em oração está diretamente ligada ao fato de que o Autor da Revelação não está morto para quem lê. Ele conversa com o teólogo enquanto este o exalta com todo seu coração e entendimento, na análise diligente do que o Senhor tem a dizer. Teologia é um diálogo, e seu resultado não é um pluralismo de interpretações, e sim a palavra autoritativa daquele que Se revela.

Por último, ressalta a Teologia como atividade humana, o esforço do homem em compreender seu Criador. Como atividade humana, sujeita a todos os atributos daquele que a exerce, entre eles a natureza pecaminosa. Desta forma, a teologia pode ser sagrada ou diabólica, de acordo com o coração de quem a estuda, razão pela qual o jovem teólogo deve ter o cuidado de viver uma vida piedosa, a qual não pode ser sufocada pelo seu esforço em analisar cientificamente a Palavra. Em termos práticos, um cientista que tiver diante de si um pedaço de pão e o utilizar apenas para estudo científico morrerá de inanição; o teólogo que vê em Cristo e na revelação apenas o objeto de estudo corre o mesmo risco da fome tendo diante de si o Pão da Vida.

Conclui-se, portanto, a necessidade de viver aquilo que se estuda. Teologia é apresentada como mais do que o esforço da mente em compreender o criador: é o filho relacionando-se com o seu Pai. Para que a Palavra que santifica não seja utilizada como meio de pecado, o jovem teólogo deverá ter como base do estudo os dois primeiros mandamentos, a humildade, consciência de humilhação inerente ao homem, piedade e devoção. A preocupação da igreja com a saúde do estudante não deve ser ignorada pelo mesmo; este deve buscar nos seus irmãos um critério de avaliação do resultado de seus estudos e do seu fervor espiritual diante de todo intelecto adquirido, desde que a Palavra chancele as conclusões de ambos.

Pedro Silva Drumond é acadêmico do primeiro período do Curso de Teologia do Seminário Teológico Congregacional de Niterói.

Daniel e Eclesiastes 11:9-10

 "Jovem, alegre-se em sua juventude! Aproveite cada momento. Faça tudo que desejar; não perca nada! Lembre-se, porém, que Deus lhe pedi...