terça-feira, 26 de novembro de 2019

Resenha do Livro: Igrejas que Transformam o Brasil




A obra dos autores Ed Stetzer e Sérgio Queiroz busca analisar diversos fatores e características das igrejas consideradas saudáveis, e que trazem mudanças não apenas para os seus próprios membros, como para toda a sociedade dentro de sua área de atuação. Para isto, os autores salientam a necessidade de haver equilíbrio de doutrina e proclamação do amor de Deus.

O objetivo dos autores é desenvolver um conceito de igreja que vai além das quatro paredes de seus próprios templos, mediante a análise de diversas igrejas locais por todo o Brasil, sem acepção de denominação. Essa abordagem não apenas apresenta todas as igrejas locais como integrantes de uma única igreja, como também deixa evidente que há determinadas características das comunidades de fé que podem apontar realidades globais. Outro grande ponto positivo desta abordagem é que analisa o tema na perspectiva brasileira. No geral importamos material estrangeiro acerca do assunto, que por vezes destoam da nossa realidade social.

Logo no primeiro capítulo um conceito base nos é apresentado: A igreja como o instrumento de Deus para os propósitos do Reino. Isto faz de cada cristão um instrumento de Deus para edificação da igreja e pregação para o mundo. Fica evidente que para os autores esta visão acerca do papel da igreja e do cristão é o marco inicial para as igrejas brasileiras comecem a causar impacto na sociedade. Em sentido contrário, o fato da igreja brasileira ter esquecido do seu papel de querigma e limitado-se, em sua grande maioria, a promover as reuniões para aqueles que já integram o seu quadro de membros e a razão pela qual a atual  contribuição cristã evangélica para o Brasil é quase nula.

Assim, os autores desenvolvem o conceito de igreja transformacional, definida como “aquela que se concentra tenazmente na capacidade do evangelho de mudar a vida das pessoas” (página 32); o que é definido e exaustivamente abordado por Mark Dever como igreja intencional. Essa diferença terminológica justifica-se pela vinculação da intencionalidade não à igreja, mas aos relacionamentos. Os relacionamentos intencionais são um meio para que a igreja se torne transformacional, operando o primeiro conceito no rol de objetivos, enquanto este último encontra-se na eficácia. Mudanças externas só ocorrerão quando a igreja retomar seus objetivos.

Os autores levam em consideração que a eficácia de uma igreja tem sido medida por um velho padrão americano que considera o número de pessoas que frequentam as atividades da igreja (cabeças), o orçamento e capital da igreja (conta bancária), e o tamanho da estrutura física da igreja (construções).

O problema se dá pois a importação de modelos avaliativos estrangeiros esbarra na realidade brasileira, o que novamente é apontado pelos autores. Em seguida, apresentam um novo modelo de medida da eficácia da igreja, que considera não a quantidade, mas a qualidade de determinados aspectos da igreja. Não basta igrejas repletas de pessoas que não podem ser consideradas discípulas de Cristo. Assim, o novo modelo leva em consideração o quão bem-sucedidas as igrejas tem sido em fazer discípulos.

Não apenas os números, como também a capacidade da igreja oferecer oportunidades dos membros desenvolverem relacionamentos de longa duração, práticas espirituais baseadas na Palavra e o uso das mesmas para produzir transformação. Isto é denominado pelos autores como Ciclo Transformacional, o qual considera: (1) o discernimento da igreja, mediante uma mentalidade missionária; (2) a capacidade da igreja abraçar, caracterizada pela liderança apaixonada, relacionamentos estáveis e principalmente na ênfase em oração; (3) o envolvimento na adoração, vida comunitária e missão da igreja.

Conceitos como uma liderança dinâmica, que independe de cargo eclesiástico ou título, bem como a percepção do evangelismo como um estilo de vida, e não um programa ou mera atividade são conceitos destacáveis nestes pontos.

A partir do terceiro capítulo da obra os autores se dedicam a trabalhar cada um dos tópicos do ciclo transformacional, iniciando pela mentalidade missionária. Para eles um grande problema tem sido um foco excessivo das igrejas em si mesmas, fazendo com que as mesmas sejam irrelevantes para o local onde estão inseridas. Para que uma igreja seja transformacional ela deve compreender que se foi inserida em uma determinada comunidade, e para transformá-la. É comum ver igrejas e congregações totalmente destoantes e mesmo alienadas em relação ao seu contexto geográfico, como se estivessem se escondendo ou evitando as pessoas a sua volta.

Alguns relatos de igrejas consideradas transformacionais trazem exemplos de como agir em prol e de acordo com as pessoas que circunvizinham a igreja, como por exemplo, a regionalização dos ritmos, consulta às autoridades locais acerca da igreja e sua atuação, entre outras medidas.

É importante ressaltar, assim como apontado pelos autores, que esta dimensão mais pessoal da igreja não exclui seu dever de enviar missionários em caráter global. A igreja deve cuidar de si, da comunidade a sua volta, mas também de pessoas e grupos espalhados por todo o planeta.

Em seguida, os autores trabalham o conceito de liderança vibrante, caracterizada pela valorização dos dons e talentos daqueles que são liderados. Ensinam que um verdadeiro líder não concentra em si o foco e atividades da igreja. Liderar é conduzir o outro na descoberta do seu lugar no Corpo, preparando-o para preparar aqueles que virão depois dele. Líderes transformacionais investem na formação de outros líderes e desejam que cada vez mais pessoas se engajem na obra, sempre salientando o sacerdócio universal de todos os crentes dentro e fora das atividades da igreja. Neste tópico, o capítulo é encerrado com exemplos de liderança transformacional pelo próprio Senhor Jesus Cristo, que deve ser o modelo a ser seguido por todo cristão.

Já no quinto capítulo o conceito de intencionalidade vem a ser trabalhado na esfera das construções de relacionamento. Uma igreja que transforma o Brasil é apresentada como aquela na qual as pessoas investem em relacionamentos, e fazem isso de forma planejada. Há intenção de amar e valorizar as pessoas em sua caminhada com Cristo. Ser relacional e intencional são coisas diferentes, pois o cristão relacional investe em construir relações, enquanto o intencional constrói relações para glória de Deus, visando a edificação do outro. Fica claro que a iniciativa de aproximar-se não deve ser daquele que está chegando, mas daquele que já está dentro.

Concordo com os Autores acerca da necessidade dos pequenos grupos, pois são eficazes mecanismos nas construções de relacionamentos, o que acabou sendo posto de lado em território brasileiro pelo trauma das experiências com G12, M12 e afins.

Também apontam a necessidade da igreja dar ênfase a oração, visto ser o que constrói uma relação estreita entre Deus e o homem. Assim, igrejas transformacionais são aquelas que investem seu tempo e incentivam seus membros a orarem. Não o fazem de forma meramente litúrgica, mas de forma espontânea, por diversas vezes, em busca de compreensão e afeição por parte do Senhor. Líderes de uma igreja transformacional precisam ter uma vida de oração, a fim de dar o exemplo aos demais. Os autores são claros: “Onde as pessoas oram, Deus opera. Onde Deus opera, a transformação acontece.”

A adoração também é apontada como uma marca de uma igreja transformacional. Uma igreja disposta a transformar o Brasil deve render-se e adorar ao Senhor diante da revelação de Cristo e poder do Espírito Santo. A adoração conecta as pessoas com Cristo, equipando-as para o ministério. Não se confunde com o estilo do louvor ou meramente a liturgia, mas engloba a resposta da congregação à obra de Cristo na cruz. Aliás, o estilo e planejamento do culto não devem levar em consideração as preferências pessoais do pastor, e sim a comunidade, de forma contextualizada. Os autores são exaustivos na tentativa de diferenciar adoração de louvor, dedicando muito tempo a abordagem sobre o tema. Ao final do capítulo adoração é trabalhada exclusivamente na figura do louvor, com diversos conselhos para escolha dos mesmos de forma contextualizada, porém adequada a Palavra de Deus.

Já o conceito de vida comunitária trazido pelos autores de certa forma trabalha pontos já abordados nos relacionamentos intencionais, inclusive no que diz respeito ao incentivo à pequenos grupos, que na verdade acabou sendo o foco do capítulo, pela ênfase na máxima participação de todos os membros.

O último tópico do livro encerra o Ciclo Transformacional. A missão é definida como a razão de existência da igreja e o evangelismo como parte natural da vida. Não se fala de momentos de missão da igreja, mas de missão a todo o momento, por ser parte crucial da igreja. A missão deve estar comprometida em levar a igreja para a cidade, mesmo que a cidade não procure a igreja. Neste sentido, podemos entender que a igreja não apenas prega o Reino, mas insere o Reino invisível na realidade visível das pessoas, através da justiça social e envolvimento com a sua comunidade e contexto.

A igreja deve definir um objetivo, preparar-se para o evangelismo, e obviamente para a oposição. O líder deve liderar a igreja, ao mesmo tempo que lidera as pessoas mediante discipulado e acompanhamento pessoal.

Podemos concluir que o livro traz uma boa proposta, com informações baseadas em uma pesquisa de mais de cinco anos. Entretanto, cabe a ressalva ao método utilizado pelos autores, uma vez que, ainda que a pesquisa seja plural no tocante as igrejas, as respostas foram dadas pelos próprios pastores e membros das igrejas entrevistas.

Há de se considerar a possibilidade de que parte destes irmãos possam ter superestimado a sua igreja. É comum que tenhamos dificuldades de nos posicionarmos de maneira contrária ou negativa às nossas próprias comunidades de fé. Não há como os autores apurarem a veracidade das informações coletadas, tornando a pesquisa, de certa forma, uma questão de confiança. Desta forma, torna-se arriscado atribuir às igrejas entrevistadas o título de transformacionais, uma vez que a despeito das respostas dadas pelos membros, poder-se-ia descobrir sérios problemas na igreja que chamariam a atenção e gerariam escândalos.

Por fim, a obra funciona como um manual prático para as igrejas, com diversos conselhos, exemplos e casos concretos. O livro é pragmático, no melhor dos sentidos, sem abrir mão da fundamentação bíblica, de forma que concilia teoria e prática de uma forma extremamente natural. A igreja transformacional precisa estar atenta à todos os aspectos do Ciclo Transformacional, sempre buscando se lapidar naqueles em que estiver em falta.

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